O percurso para o objectivo é feito com bastante potência  para diminuir o tempo em rota; aproveito para verificar o armamento e o  combustível e, já próximo, inicio os contactos via rádio na frequência  terra-ar.
Guileje esclarece-me sobre a possível origem dos disparos e  indica-me a zona do antigo aquartelamento de Gandembel como a mais  provável. À medida que me aproximo da fronteira começo a baixar de  altitude - o pessoal do lado de lá (Kandiafara e Simbeli, por exemplo)  tem a mania de treinar as anti-aéreas se nos apanham a jeito, por isso  manter os 1000' é uma solução de compromisso entre evitar os RPG e  mantermo-nos fora da vista da AAA
[4].Já no local procuro indícios  de movimento de pessoas ou veículos, tentando visualizar trilhos  recentes. Inicio uma volta pela esquerda e nesse momento sinto um  impacto forte na traseira do avião, a que se segue o ruído  característico da paragem do motor, o que posso confirmar pelo  decréscimo rápido das rotações. Tento de imediato reacender o motor  através da ignição de emergência enquanto, prevendo já o pior, prancho o  avião para um lado e para o outro na tentativa de localizar e atingir a  zona de Guileje. O motor continua parado e a velocidade não vai durar  muito tempo. Quase de seguida, sinto a perda total dos comandos do  avião, iniciando este uma descida brusca em direcção ao solo. Nem tenho  tempo de alertar a Base - provavelmente nem me ouviriam dada a minha  baixa altitude. Estou a mais no avião e a única solução é ejectar-me.  Puxo a argola de ejecção
[5] que  está por cima da minha cabeça. A adrenalina multiplicou-me as forças de  tal modo que nem sinto resistência ao accionar o sistema. A velocidade  de raciocínio multiplicou-se igualmente. Imagino que falhou a ejecção e  penso accionar a alavanca alternativa (na cadeira, em baixo, entre as  pernas). Sinto então a explosão do cartucho da cadeira e deixo de ter  consciência do que me rodeia. Afinal, passou-se 1/3 de segundo entre o  accionamento do manípulo e a saída da cadeira...
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Amparado  a uma árvore, ainda tonto, tento fazer um ponto rápido da situação e  deixo para mais tarde a análise do que se passou com o avião ou a  maneira como acordei naquele sítio. O facto é que estou em terreno  hostil, ainda distante do aquartelamento, num ambiente que é novo para  mim, sozinho e quase incapacitado de andar. E se o IN viu a minha  ejecção é natural que se dirija para o local para tentar apanhar-me.  Pelo meu cálculo penso estar a sudoeste do antigo aquartelamento de  Gandembel e considero ser a melhor opção avançar para NW, o que me  aproximaria da estrada Aldeia Formosa-Guileje e do próprio  aquartelamento.
[6]Abro  o pequeno kit de sobrevivência que nos tinha sido distribuído - na  verdade o seu conteúdo é uma novidade para mim, pois embora tivesse uma  ideia do que lá estava nunca tinha visto nenhum aberto. Aliás, o kit era  coberto por um forro em flanela, todo cosido, o que tinha impedido uma  exploração prévia do seu recheio...
O essencial é tentar iniciar a  marcha com o tornozelo ainda quente, pois receio não conseguir andar  quando a perna arrefecer. Estou num local bastante arborizado e com  muita vegetação junto ao solo, o que dificulta a progressão. Avanço a  coxear, tropeçando com frequência. Tenho receio de perder a bússola que  vinha no kit, é minúscula e se a deixar cair, naquele terreno,  arrisco-me a não conseguir encontrá-la. Opto por segurá-la entre os  lábios, ficando com as mãos livres para me ir apoiando sempre que  tropeço. Com o tempo aumentam as dores na perna e a progressão é cada  vez mais difícil.
Parece-me começar a ouvir barulho de aviões a jacto  - será o outro avião de alerta já à minha procura? Começo a alterar as  minhas prioridades - agora a minha preocupação é tentar encontrar um  local mais aberto de onde possa disparar os very-lights e ser localizado  por um avião. E há que ter cuidado, que os meus recursos são limitados,  para alimentar a caneta dos very-lights só tenho nove cargas - a  dotação que nos era normalmente atribuída
[7].  Mas a copa das árvores não deixa muito espaço para manobra.
Finalmente,  alcanço uma zona que está longe de ser a ideal mas que, dado o desnível  das copas das árvores, poderá permitir o disparo enviezado dos  very-lights, o que talvez possibilite a sua visualização do ar. O facto é  que já não consigo andar e as costas também me doem bastante. Não me  parece que consiga sair dali pelos meus meios.
Não temos rádios  distribuídos, mas no kit vêm uns fósforos presumivelmente anti-humidade.  Pode ser que fazendo uma fogueira... No momento também não vejo grande  utilidade no preservativo que vinha no kit. Se a ideia era servir de  contentor de água, esqueçam, que aqui não há nenhuma... O mesmo para o  anzol - só se for para as férias...
O ruído dos aviões começa a ser  mais frequente, mas parece que a área de busca é ainda afastada. Mesmo  que eles se dirijam na minha direcção não vou conseguir vê-los e eles  também não irão localizar-me; a única esperança é que vejam um  very-light.
Sento-me encostado a uma árvore, virado para a zona mais  descoberta (ou, será melhor dizer, menos cerrada...). Ao fim de algum  tempo sinto a aproximação de um jacto. Parece vir na minha direcção, mas  não consigo vê-lo. A minha experiência permite-me ter uma ideia, pelo  som, da direcção e da distância do avião em relação ao ponto em que me  encontro; disparo o primeiro "very-light" - um verde, apesar de não me  sentir em grandes condições físicas - mas os minutos seguintes não me  dão qualquer indicação de que tenha sido visto; nem as duas horas  seguintes - as minhas tentativas de ser visto não estão a resultar e já  utilizei quatro dos nove very-lights (já comecei a gastar dos brancos,  mas a verdade é que já estou a borrifar-me para as cores!).
Começam a  aproximar-se as cinco da tarde - na Guiné a transição do dia para a  noite ocorre cedo e com uma certa rapidez; sinto que já não tenho muito  tempo para ser localizado antes de escurecer. Volto a detectar a  aproximação de um avião e disparo mais um very-light. O avião passa  próximo, sinto-o dar a volta e passar outra vez próximo de mim, a baixa  altitude
[8].
Fico  com a esperança de ter sido visto, mas a hora seguinte não confirma as  minhas expectativas. E a noite cai finalmente, avolumando-se com ela a  minha apreensão, dada a minha visível inadaptação ao ambiente que me  envolve. Sou perturbado por uma série de dúvidas que me assolam, para as  quais não tenho resposta - Os pilotos terão visto algum very-light?  Estará a ser organizada uma operação de recuperação? Como pensarão  recolher-me? O IN terá detectado a minha ejecção? Irão tentar  "agarrar-me à mão"?
A noite vai ser certamente prolongada - e pouco  dormida, seguramente. Aproveito para repousar um pouco o corpo,  estendendo-me no chão, o que me permite reduzir as dores nas costas e  simultaneamente dar menos nas vistas de quem se aproxime.
Tenho algum  tempo para pensar no que me levou a esta situação. O IN terá pelos  vistos atingido o Fiat, do que resultou a falha do motor, logo seguida  da perda de comandos. Dadas as condições em que estava a voar, não tenho  dúvidas de que a ejecção terá ocorrido nos limites da segurança, a  baixa altitude e com uma acentuada razão de descida do avião  desgovernado. Do modo como observei o paraquedas, meio pendurado ao  longo da árvore, começo a acreditar que ele apenas terá completado a sua  abertura já no contacto com a árvore em que me enfeixei, o que terá  travado a velocidade da descida, acabando eu - mesmo assim - por entrar  depressa demais pelo chão, provocando as lesões na perna esquerda.  Calculo agora que será mais que uma entorse, embora não haja fractura  completa da perna, nem fractura exposta.
Lembro-me que a minha arma  pessoal - uma Walther PPK .22 
[9] -  ficou guardada no anti-g, mas não tenho a certeza se não será melhor  assim - a posse da arma dar-me-ia a tentação de a usar em situações em  que tal não era recomendado. Bom, não tenho a arma, não vale a pena  pensar mais nisso.
A noite é interminável - mantenho-me desperto  embora por vezes o cansaço me faça dormitar, mas acordo logo, alertado  por um qualquer barulho. A tensão da situação e a desidratação que  começa a afectar-me também não contribuem para me acalmar. No escuro  parece-me detectar o movimento de um insecto que brilha, mas trata-se  afinal dos ponteiros luminosos do meu relógio, a que a minha visão  desfocada (por falta de referências) parece dar uma sensação de  movimento... Acordo outra vez com a sensação de algo encostado à minha  perna (uma cobra?) - não me mexo, até porque cobras não são o meu forte;  será a perna partida a latejar que dá aquela sensação de movimento? A  verdade é que essa sensação passa - ou o animal se foi ou a perna deixou  de latejar...
Cometo um erro ao poisar a cabeça no chão para  repousar. Fico com uma orelha encostada ao chão, o que amplifica todos  os sons produzidos à minha volta. O simples contacto de uma folha a  cair, ao bater no chão, faz lembrar a progressão pé ante pé, de alguém  que se aproxima. Apesar de a escuridão não o permitir, parece-me divisar  duas sombras que se vão aproximando de mim...
O amanhecer  encontra-me exausto, mas satisfeito por ver a luz do dia. Fico a  aguardar o regresso dos aviões para tentar perceber o que estão a  planear. Finalmente começo a ouvi-los. É uma miscelânea de sons que vou  identificando - Fiats, T-6, DO, AL-III. Começo a ter a certeza de que  fui localizado. Pelo sim, pelo não, quando sinto a sua aproximação,  disparo mais um very-light. Mas sistematicamente, parece que os AL-III  se aproximam e a uma certa distância voltam para trás
[10].
Os  very-light esgotam-se finalmente. Resolvo despir a parte de cima do  fato de voo e retirar a camisola interior, branca. Depois de vestido  novamente o fato de voo, decido pôr a camisola interior por cima, à laia  de pull-over. Espero ter assim mais possibilidades de ser detectado do  ar, por fazer agora um maior contraste com a vegetação.
São nove  horas da manhã - já passaram 3 horas de luz e nada. Tinha pensado que um  AL-III com guincho chegaria à vertical e tentaria recuperar-me pelo  ar... mas a verdade é que nenhum aparelho me sobrevoa.
Em desespero,  resolvo fazer um fogo que seja visto do ar (má ideia, que ainda posso  ficar carbonizado...) mas a natureza ajuda - a vegetação está húmida... e  os tais fósforos anti-humidade também! Vários falham e não consigo  acender nada. Quando risco o último, a cabeça salta, ainda por arder.  Tiro as luvas e com a ponta dos dedos seguro a cabeça do fósforo,  friccionando-a contra a lixa: começa a arder queimando-me os dedos mas  apagando-se logo de seguida.
Resigno-me a esperar por auxílio, que da  minha parte parece-me não haver muito mais a fazer. Mas a desidratação e  a tensão começam a pregar-me partidas. Pressinto a aproximação de  pessoas, mas não as identifico. Começo a pensar que é pessoal do PAIGC  que está a envolver-me, na esperança de poder preparar uma emboscada ao  helicóptero ou helicópteros de salvamento. Chego à conclusão que o  melhor é não chamar a atenção dos aviões, pois se eu pelos vistos já  estou "aviado", não vale a pena levar comigo algum camarada que esteja a  tentar salvar-me.

Começo a divisar cabeças que se aproximam pelo meio  da folhagem; são africanos, o que parece confirmar as minhas piores  previsões; o armamento e uniformes também não são das tropas  portuguesas. Sabem o meu nome (mas também não é difícil, têm  provavelmente infiltrados na Base). Dizem-me para ir com eles - e eu  peço-lhes "delicadamente"
[11]  para se irem embora e me deixarem em paz.
Aparece o que parecia ser o  chefe - de barbicha e óculos - e diz-me que é o Marcelino da Mata. Ora  eu, "pira" de 4 meses da Guiné, embora conhecendo as referências do  senhor, nunca o vi pessoalmente, mas é conhecido que ele costuma levar  cantis com Fanta e Coca-Cola. Peço-lhe de beber, ao que ele anui.  Provado o produto fica confirmada a identidade do meu interlocutor, o  qual merece da minha parte, de imediato, um efusivo cumprimento: "Ah  granda Marcelino!".
Chega entretanto ao local pessoal meu conhecido  do BCP12 e renova-se a minha confiança em acabar bem o dia. Ao ponto de,  quando sugerem a construção de uma padiola, ter recusado: "Entrei nesta  mata de pé e é de pé que vou sair" - Pudera! Agora que já tenho as  costas quentes...
A deslocação até ao helicóptero não tem grande  história, embora seja demorada e cansativa, pois a incapacidade da minha  perna esquerda obriga-me a progredir no terreno apoiado em dois  elementos das Operações Especiais, um de cada lado.
O pessoal do  Marcelino tem pelos vistos a mania de provocar o IN pois, à medida que  avançam no terreno, gritam para o mato "Eh F.... da P.... do C.......!  Apareçam, seus C....!", ao que eu lhes sugiro que primeiro me ponham no  helicóptero e depois resolvam essa contenda com os outros, que por mim  já tenho que me chegue. Só me falta que aqueles tipos comecem aos tiros  uns aos outros, e eu sem me poder mexer!
Durante o percurso, noto que  um dos paraquedistas que vai à minha frente se vira para trás de vez em  quando, tirando-me uma fotografia.

Ora eu ainda estou um bocado descomposto e continuo  com a camisola branca por cima do fato de voo. Peço uns momentos para  tirar a camisola, que guardo num dos bolsos do fato de voo,

e prossigo a caminhada com mais à-vontade, pois já  me sinto razoavelmente enfarpelado e em condições de enfrentar a máquina  fotográfica. Apesar dos perigos, a nossa progressão começa a parecer um  passeio turístico, pois chegamos a parar para tirar uma foto de grupo.

O Marcelino resolve pôr uma pose mais agressiva, de  catana na mão, o que, associado à minha cara de enfiado, mais faz  parecer que fui apanhado pelo IN...
Chegamos finalmente à orla da  mata, onde um AL-III nos espera. Para apoiar aquela evacuação, o Serviço  de Saúde da BA12 tinha destacado um médico
[12].

Quando entro no heli, devo estar com um aspecto  abatido pois ele decide dar-me um tónico qualquer que eu aceito de bom  grado, que ainda estou com sede... E o facto é que fico com uma passada  que ninguém me cala! Também, tinha estado quase 24 horas sem falar...
Aterramos  em Guileje, onde muitos militares curiosos esperam para ver o aviador  recuperado; alguém resolve dar-me, em jeito de compensação, uma garrafa  de champanhe. Um novo helicóptero está a postos no local para me  transportar para o Hospital Militar; também já lá está a enfermeira  paraquedista que me vai acompanhar, a enfermeira Giselda
[13]; embarcamos no helicóptero e  mantemos 1500' de altitude
[14]  em direcção ao Hospital, onde chegamos sem problemas. Tiradas várias  radiografias, confirma-se a fractura do perónio; depois de me colocarem o  gesso na perna partida,

o helicóptero leva-me (mais a garrafa de espumante)  para a placa de helicópteros da Base - parece que finalmente acabou o  dia e que vou poder descansar de tantas emoções. Engano meu!

À chegada à Base sou surpreendido pela presença de  um grupo de militares da BA12 - pilotos, mecânicos, enfermeiras e outros  - que resolvem festejar exuberantemente a minha recuperação. Sinto-me  emocionado com esta recepção. Para além dos laços de amizade que tenho  com alguns dos presentes, neste momento eu represento para eles o  produto final do trabalho que, directa ou indirectamente, desenvolveram  com tão bom resultado. Por isso sentem-se felizes por eu estar ali. E eu  estou feliz por ter regressado a casa.
Miguel Pessoa
(Por  vezes "Kurika" ou "Kurika da Mata")
[1] Nas  missões normais o piloto usava o fato anti-g (que permite ao corpo  suportar maiores acelerações (Gs)), o "Mae-West" (colete insuflável para  a água), as fitas para as pernas (que, ficando presas à cadeira, no  caso de uma ejecção não controlada puxavam as pernas para trás, evitando  lesões graves nos joelhos e/ou nas pernas num possível contacto com o  aro da "canopy" durante a ejecção) e, naturalmente, o capacete de voo  com a máscara acoplada. No caso da saída do alerta, que se pretendia  muito mais expedita, muitas vezes dispensávamos o anti-g, levando apenas  o "trikini"- como lhe chamávamos - o capacete, o mae-west e as fitas da  cadeira, isto no pressuposto de que a carta 1/500.000 e as luvas de voo  já estavam guardadas nos bolsos do nosso fato de voo. O paraquedas  estava integrado na cadeira de ejecção, por isso era "vestido" quando  nos sentávamos dentro do avião.
[2] A  descolagem de corrida era um procedimento mais expedito usado nas saídas  de alerta em que o avião, quando entra na pista, está já a ser  acelerado para a descolagem e os procedimentos antes da descolagem são  feitos enquanto o avião ganha velocidade na pista. Pelo contrário, em  condições normais o avião é imobilizado no início da pista, são  efectuados os procedimentos antes da descolagem, é acelerado o motor  para a potência máxima e, verificada a normalidade de todas as  indicações do motor, são libertados os travões, e o avião inicia então a  corrida de descolagem (o percurso na pista desde que larga travões até  ter as rodas no ar).
[3]  Indicativo normal da parelha de alerta. Nos Fiats não usávamos os nossos  indicativos pessoais, apenas no DO-27, onde o meu nome de guerra era  "Kurika".
[4]  Artilharia Anti-Aérea
[5] A que  chamávamos Sto.António, por ser em forma de auréola... Ao puxar-se para a  frente, accionava o sistema de ejecção e desenrolava uma lona que  tapava a cabeça do piloto, protegendo-o de certa forma de pequenos  destroços e do fluxo de ar exterior, quando a cadeira saía do avião.
[6]  Infelizmente o meu raciocínio estaria certo se eu estivesse a sul  daquela estrada. Mas as manobras que fiz levaram-me para norte dela e eu  nunca mais iria cruzar a referida estrada...
[7] 3  very-lights verdes, 3 brancos e 3 vermelhos, usados de acordo com o  estado em que o aviador se encontrava (do menos grave para o mais  grave). Isto seria aplicável se fossem muitos. Assim, a partir de certa  altura usa-se os que temos, não importa a cor...
[8]  Contar-me-iam mais tarde que o TCor. Brito, Comandante do GO1201 - o  piloto em questão - referenciou o disparo deste very-light e sobrevoou  novamente o local, tendo divisado com algum custo o meu paraquedas, meio  enterrado numa árvore. Convencido de que o piloto estaria num estado de  saúde razoável, acertadamente considerou que não havia condições de  segurança para lançar de imediato uma operação de salvamento, dada a  hora tardia, antes preferindo iniciar o planeamento de uma operação bem  sustentada, a desencadear nas primeiras horas da madrugada.
[9] As  armas de baixo calibre, embora menos eficazes, eram as mais apropriadas  para os pilotos dos Fiats. Veja-se que uma arma destas, pesando cerca de  500g, representa mesmo assim um peso de cerca de 9 kgs durante uma  ejecção (18 Gs=18x a aceleração da gravidade). Assim, com uma arma de  maior calibre (e peso correspondente), em caso de ejecção o piloto  arriscava-se a vê-la rasgar o bolso ou o coldre em que a guardava, e  desaparecer.
[10]  Soube posteriormente que naquela altura os AL-III procediam à colocação  de Paraquedistas e Operações Especiais na orla da mata em que me  encontrava, para estes depois prosseguirem a pé na minha direcção.
[11]  Segundo alguns testemunhos, parece que não foi bem assim. Eu terei dito  "Vão-se f.... ; deixem-me morrer aqui em paz sozinho" ou algo  semelhante. Tenho que aceitar esta última versão como correcta, porque  por aquela altura eu já tinha os platinados a falhar. Embora me choque,  porque sempre fui uma pessoa bem educada...
[12]  Convém esclarecer o porquê da presença de um médico nesta situação.  Pouco tempo antes tinha surgido uma determinação do Estado-Maior que  proibia a ida das enfermeiras paraquedistas à zona de combate. Esta  decisão surgiu na sequência da morte de uma e ferimento de bala de  outra; o curioso é que nenhuma destes casos ocorreu no decurso de uma  evacuação à zona, pois uma morreu num acidente na placa dos DO-27 (na  Guiné) e outra foi atingida por uma bala quando voava noutro DO-27 (em  Moçambique). Isto mostra o receio que as chefias tinham dos efeitos na  opinião pública, caso ocorresse a morte de uma enfermeira em verdadeiro  cenário de guerra. À época aceitava-se que as mulheres apoiassem o  esforço de guerra, mas na retaguarda, enquanto que não se via com bons  olhos que ela participasse activamente na frente de combate.
[13] A  Giselda acompanhou-me nessa evacuação e, desde então, nos momentos mais  importantes da minha vida - casámos em Outubro de 1974.
[14] Não  há dúvida que tivemos sorte. Embora começassem a surgir no TO os mísseis  Strela, até ali desconhecidos, nenhum deles estava, pelos vistos, no  percurso que seguimos para o Hospital. A altitude mantida colocava-nos  perfeitamente ao alcance do míssil. Mas não era o nosso dia... 
VB:Companheiros,este texto  está em meu poder à alguns dias,por foi por disponibilidade de tempo ou  esquecimento que o não editei,foi apenas e somente a emoção que me  aprisiona os movimentos de cada vez que me disponho a fazê-lo.