Arlindo Pereira (Piriscas)
2ºSargºMil. MMA Tete-Moçambique
Lisboa
Soldados de PORTUGAL fuzilados clandestinamente
Caro Paiva e Sousa:
Escrevo-lhe estas linhas para esclarecer o sucedido com Aruna Candé, depois da sua saída da Guiné.
Ele, que era o milícia n.º 35/64, em 1968, passou a pertencer à 2.ª Companhia de Comandos Africanos, constituída em 1971.
Foi o porta-estandarte desta companhia com o posto de furriel. Como diz, ele encontra-se na fotografia da capa do meu livro "Guerra, Paz e Fuzilamento dos Guerreiros; Guiné 1970-1980" (2007), juntamente com o Tenente Adriano Sisseco (depois graduado em capitão), Comandante dessa Companhia e o Alferes Aliú Sada Candé (condecorado com a Cruz de Guerra). Todos estes graduados "comando" seriam fuzilados clandestinamente depois da independência da Guiné.
Nas páginas 143 a 146 daquele livro encontram-se as identidades dos 20 oficiais, 29 sargentos e 4 soldados dos "Comandos Africanos", que foram alvo de tais atrocidades e com os nomes implantados numa placa junto do Monumento ao Esforço Comando, agora no Centro de Tropas Comando, na Serra da Carregueira.
Não serão crimes contra a humanidade (que não prescrevem) fuzilar clandestinamente (normalmente nas proximidades das prisões) estes detidos, que não tiveram a mínima possibilidade de se defenderem das acusações que lhe seriam atribuídas e enterrados em valas comuns?
Tal sucedeu com Aruna Candé, nascido em 11-6-1946, em Farim e que, depois já graduado em 1.º sargento, seria fuzilado em data não determinada, em Cuntima.
Saliento o que ele afirmava, quando, com simplicidade, se dirigia neste aerograma ao "seu" Alferes Paiva e Sousa.
Depois de perguntar pelo seu primeiro comandante de pelotão dos "Roncos de Farim", o Alferes Filipe Ribeiro, apenas escrevia: "Se o encontrares diz-lhe que eu lhe mando muitos cumprimentos, um abraço e aperto de mãos".
A propósito, recordo que o Presidente do Senegal, Leopold Senghor (poeta e membro da Academia Francesa) também colaborou nos referidos mortícinios, ao mandar fazer a entrega na Guiné, às forças do PAIGC, de militares dos comandos, tropa normal, fuzileiros, milícias e outras autoridades gentílicas, que se tinham exilado naquele país e, na maioria, seriam igualmente fuzilados clandestinamente.
Alguns dos poucos comandos africanos que lá permaneceram, viriam para Portugal, nos anos 80, com o apoio da Associação de Comandos e podem comprovar o sucedido.
Janeiro de 2009 Coronel Manuel Bernardo O Aruna foi fuzilado na mata do Oio?.
Está na capa do livro do T.Cor Bernardo.
Ao arrumar a correspondência da Guiné encontrei esta carta que veio aumentar a minha desolação. (...)
Nós milicianos valíamos mais e merecia mais o nosso esforço.
Tanto trabalho, tantos riscos.
Que nojo de revolução!
Abraços Manuel