236-Fabrício Marcelino
Ex-Esp.MMA Guiné
Leiria
Colega Barata,
Com um abraço amigo,conto hoje mais uma das minhas memórias da Guiné.Embarcámos para a Guiné,em 1962, a bordo dum velho quadrimotor a hélices, Skymaster.
Cheio como um ovo, com pessoas e material pesado, muito necessário naquelas paragens de África.Descolámos por volta das 08h00 e, quando tínhamos cerca de uma hora de voo, notámos que o avião deu uma volta de 180º!Reparámos que o motor nº 4 estava parado e, as hélices em paço de bandeira!
Um dos mecânicos de bordo era o Silva, um colega do meu curso, que nos confirmou a avaria no motor e, que o avião tinha ficado sem comunicações! Antigamente era assim, caros colegas mais jovens!
A certa altura, o motor do mesmo lado, ficou com uma grande fuga de óleo. Se até ali o receio existia, depois o nível subiu para medo!Foram-nos distribuídos os coletes de salvação e foram dadas instruções adicionais, tais como: Onde se encontravam os barcos, os sacos de pó anti-tubarão, o rádio e os procedimentos a ter no mar até nos socorrerem!Foi uma eternidade até Lisboa!Enquanto avistámos mar, o nosso medo era de nível médio, mas quando começámos a ver os chaparros, passou para a escala máxima!
Nesse tempo não haviam locais mais próximos para aterrar,porque a B.A.11 só foi inaugurada em 1964 e o aeroporto de Faro em 1965!
Chegados ao aeroporto de Lisboa,fizemos a aterragem de emergência, com os bombeiros e ambulâncias atrás de nós, mas tudo acabou bem!Reparado o avião,com receio, voltámos a descolar a meio da tarde.
Após uma aterragem no aeroporto de Las Palmas, nas ilhas canárias,para
reabastecimento,rumámos a Bissalanca, onde aterrámos cerca de 12 horas depois, pelas 03h00 da manhã.
As surpresas ainda não tinham terminado, estava à nossa espera, o Oficial de dia para nos transmitir que, o Alf.Pilav.Geada, entrava de Oficial de dia e eu de mecânico de dia à Base e um colega nosso Mec. de Rádio para meu ajudante!Levaram-nos para Bissau, para um hotel e pensões, onde ficámos hospedados.
Pelas 09h00,lá estávamos ao render da parada,para entrar-mos de serviço,moídos, sem dormir e sem conhecermos um metro que fosse da Base.
Dos vários aviões que recebi nesse dia, apareceu um DC-6, comandado pelo Cor. Abecassis (salvo erro era este o nome). Quando lhe dei ordem para parar os motores, por várias vezes, este deixou um a trabalhar e, ficou a olhar para mim,como se olhasse a paisagem da Lezíria!
Quando lhe pareceu gritou-me a perguntar quando é que eu ligava o put put!Como nunca tinha recebido um DC-6 desconhecia este procedimento obrigatório, antes de parar o último motor, porque nos F-86 o put put só era necessário para o arranque.
Pedi auxílio, a um colega lá colocado e, este até me ajudou a ligar o mesmo.Após saír do avião, o senhor todo poderoso,com a sua arrogância,levou-me ao Oficial de dia e participou por escrito, mesmo depois de tanto eu, como o Oficial de dia, lhe contarmos o que tinha acontecido connosco!Assim começou da pior maneira o meu primeiro dia na Guiné!
Só me safei dum castigo, graças ao GRANDE HOMEM,nosso comandante de missão (à data) cap.Pilav.Almeida Brito.O Avião que nos levou à Guiné, caíu uns meses depois em S.Tomé e Príncipe faleceu toda a tripulação, incluindo o nosso colega Silva.
Paz á sua alma.
Fabrício Marcelino,
ex-Cab.Esp. MMA