quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

VOO 1318 COMO FOI O MEU PRIMEIRO VOO DE HURRICANE.



Fernando Moutinho
Cap.Pil. Guiné
Alhandra






Legenda: Tiger Moth da Aviação Portuguesa.
Foto:
Wikipedia


Diga-se, antes de mais, que tendo feito o meu "baptismo de voo" em 9 de Janeiro
de 1952, num Tiger Moth com a matrícula 139,

Legenda: Um T6-Harvard voando no espaço aéreo de Angola.
Foto:
José Santos (ex-OGMA)
comecei a voar, na altura, num avião denominado Harvard, o nº 1613, no dia 3 de Junho do mesmo ano e,

Legenda: O Hurricane estacionado na placa
Foto:
José Santos (ex-OGMA)

finalmente, a 3 de Setembro efectuei o 1º voo no Hurricane nº 600 .
Naquele tempo, as coisas não eram feitas com o rigor e o profissionalismo de
hoje, eram o paradigma do "desenrascanço". Assim, deram -me 3 páginas de papel de
stencil com uma breve descrição do avião mas, nada ou quase nada sobre o
comportamento do avião.
Falava na velocidade de perda com trem e flaps em baixo e com o avião limpo e,
ainda, nos limites do motor com algumas referências a regimes de cruzeiro e subida, etc.
Na véspera do voo, um instrutor levou -me a sentar no cockpit e indicou -me como
fazer um arranque, como funcionava a alavanca do trem e dos flaps (era a mesma), dos
travões (pneumáticos), rádio e alguns conselhos mais. Depois, disse -me para continuar
sentado a memorizar as explicações e respectivo cokpit.
Dia seguinte, o primeiro voo.
Pela primeira vez coloquei o "mae-west" (colete salva -vidas), o passe -montanha com os
óculos facetados e a máscara de oxigénio. Novidades estas que , associadas ao
accionamento do comando da rádio, uma pequena patilha na frente da máscara, e com a
cabine tipo vidros de janela, me deram uma sensação de estranheza e irrealismo que se
acentuou quando após o ”pôr em marcha”, teria de fazer uma rápida rolagem, de acordo
com as recomendações , para evitar o perigo de aquecimento do glicol do sistema de
refrigeração do motor.
Lá fui até ao princípio da faixa, consegui obter autorização da Torre, alinhei
acelerei o motor, mantendo a direcção e, …no ar. Como? Não sei! Motor para a frente,
olhos na velocidade, tirar o avião do chão, recolher o trem e flaps foi uma acção
automatizada. Já no ar, seguindo as recomendações, reduzi um pouco o motor e
observando a velocidade, comecei a subir. Num ápice, tinha atigido 16.000 pés. Foi
quando comecei a tomar consciência do se que se estava a passar. Nunca tinha estado
tão alto.
Reduzi o motor, respirei fundo várias vezes e,que fazer? Principal preocupação,
teria de aterrar . Mas, antes, precisava de fazer algumas manobras para sentir o avião,
incluindo perdas e “compreender” a máquina.
Entretanto fui descendo para 12.000 pés circulando sobre a Base pois não queria
perder o campo de vista, tendo iniciado várias manobras para experimentar os comandos,
reacção do motor e as referidas perdas para sentir confiança na aterragem. As primeiras
sensações foram de admiração por ter nas mãos um avião tão dócil mas ao mesmo
tempo com garra. Aquele motor era uma maravilha. Que belo ronronar!
Por fim, tive de me deixar de devaneios e pensar em aterrar. Assim o fiz. Não me
pergunte como? Pois correu tudo muito bem. Sinceramente, só dei por mim a tocar o
solo e a preocupar -me em manter a direcção, em virtude da dificuldade em se ver para a
frente (não esquecer que tinha roda de cauda). Rolagem rápida. Estacionamento e, um
acordar maravilhado pelo que tinha vivido. Tinha m passado 40 minutos.
Foi a prova mais complexa de toda a minha vida de piloto. Ficou -me bem gravada
mas, valeu a pena! Bons tempos!
Não me considero herói. A prova é que não fui só eu que passou esse teste, todos
os outros meus colegas de curso o passaram.
Um abraço
Moutinho
VB: Mais uma excelente história vivida pelo Fernando Moutinho,onde nos elucida das grandes proezas dos nossos antigos pilotos da FAP.