terça-feira, 12 de janeiro de 2010

VOO 1408 QUE ENORME CORAÇÃO,O DA IVONE.





Fernando Moutinho
Cap.Pil. Guiné
Alhandra


Boa tarde Barata
Acabei de consultar a nossa "aeronave" e, deparou-se-me a Ivone.
Tive a honra e o prazer de conviver com ela, na Guiné e, com ela, executamos algumas missões de evacuação.Sempre a admirei pela sua disponibilidade, competência e um enorme coração.
Lamento a sua doença.
Fernando Moutinho




Guiné, 1964
Sou mandado executar uma missão de Evacuação a Catió.A informação referia vários feridos graves necessitados de assistência a bordo.Quem me acompanhou no DO-27? A Ivone. Chegados a Catió deparamo-nos com 2 feridos indígenas em estado gravíssimo:Eram irmãos ao serviço das nossas Forças Armadas.

Numa emboscada, além de outros feridos menos graves, estes dois tinham uma rajada que os atingiu no ventre, estando em estado terminal não dando acordo de si.Imediatamente a Ivone os recolocou nas macas do DO-27 e instalou um sistema de alimentação a soro para tentar aguentá-los com vida até Bissau.

Enquanto estes preparativos estavam a ser efectuados, reparo que um indígena mais idoso, envergando uma túnica dourada e respectivo adereço com dourados, na cabeça, (era um homem “grande”*) acercou-se de mim e com um ar orgulhoso referiu-se aos filhos, dizendo-me:
Se morrerem, já cumpriram a sua missão na terra, foram a Meca, têm filhos e lutaram pela Pátria.

Estas palavras abalaram-me, pela convicção que foram pronunciadas.

Nunca gostei de contar isto porque ninguém acredita que houvesse habitantes “locais” que sentissem e honrassem esses valores.

Logo que possível descolei subindo acima de 3.000 pés para apanhar ar mais fresco. Durante o voo, um dos feridos abriu os olhos e ficou acordado mas sem falar. O outro continuou inconsciente. Mas, a Ivone continuava a prestar-lhe os cuidados possíveis. Grande profissional.

Em Bissau a ambulância levou-os para o Hospital.No dia seguinte eu e a Ivone fomos ao Hospital saber o estado dos feridos: um não resistiu, o outro felizmente recuperou


*
Chefe de aldeamento de locais

VB.É de facto impressionante as qualidades humanas que estas mulheres empregavam no desempenho das suas funções.Abdicavam, muitas vezes,da sua vida pessoal para assistir a quem lutava com a morte, que muitas vezes conseguiram combater, vencendo.
Muitas vezes me tenho manifestado em defesa destas verdadeiras "MULHERES DE GUERRA"para o facto de tão abandonadas terem sido pelos sucessivos governantes deste País.Embora não tenha convivido com a Ivone, partilhei a minha estada no teatro operacional da Guiné,com a Giselda,Octávia,Celeste,que,embora com funções diferentes,era impressionante o ritmo de vida destas "guerrilheiras da saúde"! A Giselda,com quem mais convivi pelo facto de cumprirmos a comissão +/-na mesma altura,por quem hoje ainda nutro um carinho muito especial,tratando-a por "minha menina"! (Sabe,sabe...o Miguel sabe!).
A Celeste,que para se apreçar em salvar os outros,faleceu.
Ainda gostava,e acho merecido,ver estas MULHERES DE GUERRA,serem homenageadas.Pela FAP ,já o foram,graças à sensibilidade humana de um grande CEMFA que se chama ANTÓNIO TAVEIRA MARTINS,pelo governo...lanço um apelo aos nossos governantes.