Manuel Bastos
Fur.Mil.OP.Esp.
Coimbra
Os crimes do António
Não entendo a autoflagelação nacional. Fazendo um esforço para descer o meu nível de entendimento à escala da imbecilidade, vejo de vez em quando uns inconsoláveis patriotas cheios de piedosas intenções, ungindo a desgraça nacional com uma autoridade moral de que me escapa a origem. Não passam de criaturas carentes de atenção e de afecto a babarem-se de ciúme. Viram para os seus pares as suas pulhas, e são frequentemente aduladores das grandezas forasteiras; como se ao dizerem mal da sua própria família fizessem crer que degeneraram em qualidade. O nosso grande defeito é dar-lhes atenção.
Alguns chegam ao extremo, como se viu recentemente um grande escritor numa entrevista, de confessarem crimes de guerra que nunca cometeram, por mera falta de oportunidade, já que não por rectidão, pois que não estão a penitenciar-se, estão a tentar resgatar um passado em que passaram ao lado da tragédia sem mérito nem glória, e de onde vieram sem ao menos terem uma história sua para contar.
O espaço da ficção é onde podem recriar o enredo das suas vidas, corrigindo a mediocridade das suas experiências, quando as tiveram. Já as declarações públicas, tentando o número da carpideira lamurienta alardeando os podres nacionais, e ainda por cima incluindo-se neles sem pudor nem arrependimento, são um acto patético de volúpia do ignóbil.
Coitados, fazem tudo isto por vergonha de assumirem a própria insignificância, preferem negar a inocência sem mérito, à custa da duvidosa confissão de um crime colectivo.
Manuel Bastos