sábado, 19 de fevereiro de 2011

Voo 2161 ACIDENTE DO DORNIER DO 27 Nº3435.




Jorge Mendes

2ºSargº.Mil.EABT
Coimbra



ACIDENTES COM AERONAVES DA FAP- DO-27 NR.3435

Caro Comandante, restante Comando e toda a Linha da Frente e Companheiros que visitam esta nossa Base as minhas saudações amigas.

Na continuidade dos voos 1923,2000 e 2021, solicito autorização à torre para mais uma aterragem cuja carga da aeronave é mais um acidente com um dos nossos aviões da nossa FAP desta vez ocorrido em Dezembro de 1968 no Negage – Angola.

Assim passo a mencionar o plano de voo:


1-TESTEMUNHO DE PILOTOS DA BA-7 S.JACINTO


Dois alferes pilotos do mesmo curso o Lamy e o Lopes do AB-3 Negage, descolam para um voo de rotina num DO-27.O cacimbo estava cerrado e ao regressar à base enfiam-se a voar por um morro, tendo ambos falecido no impacto. Seria este simplesmente mais um triste caso de indisciplina de voo a ceifar a vida de dois jovens, não fosse um falso desenvolvimento, a saber: à noite ouvimos na camarata da BA7-S.Jacinto, o locutor da Rádio Portugal Livre, emitida a partir da Argélia , regozijar-se por mais “esta vitória dos combatentes da liberdade de Angola” (isto apesar do inimigo não ter tido qualquer actuação neste acidente).

2-TESTEMUNHO DO COMPANHEIRO ESPECIALISTA CARLOS JOSÉ SANTOS( BILTRO )


Nem que dure cem anos nunca vou esquecer o acidente no Negage que vitimou o Tenente Lamy um outro piloto, do qual não me lembro o nome e o nosso colega dos Açores( MMA ) o Massas. Saíram do Negage de manhã muito cedo num DO-27, para fazer um RVIS, estava tudo ainda muito cacimbado, bateram nas copas das árvores e ficaram lá.

Eu fiz vigília aos corpos na capela da Base das 4 às 6 da manhã.

Arrepiante não esquecerei nunca.

3-TESTEMUNHO “A VERDADE OFICIAL DOS FACTOS”


Análise: o acidente com o DO-27 nº 3435 do AB-3 – Negage ocorrido no dia 20 de Dezembro de 1968.


Tripulação:

Manuel António Salgueiro Lopes-Alf.Milº Pilav –Adjunto de operações ( operador )

Vasco Lamy Rodrigues Matias – Alf.Milº Pilav

António Carlos Dias dos Anjos – Alf.Milº Pilav

António Duarte Almeida Correia – 1ºCabo Esp. MMA.

Aeronave totalmente destruída.

Colisão da aeronave com o solo por voar excessivamente baixo, devido à má visibilidade e teto baixo.

Falha do Operador.

Plano de voo: Negage para Negage

Houve violação das regras gerais de voo determinadas pelo Comandante de Esquadra.

O Operador tinha 1.387H30 horas de voo e nesta aeronave 280H10, tendo voado nos últimos 30 dias 12 horas.

Local do Acidente: Serra de Canzundo pelas 07H10.

Colisão com objectos no solo. Condições meteo desfavoráveis.

História do voo: O DO-27 nº 3435, descolou da pista do AB 3 às 06H55 para uma missão de RESP.

A finalidade da missão era a de observar as condições meteo existentes na Serra Ambuíla com vista à efectivação de um bombardeamento nessa zona.

A bordo além do Operador seguiam dois pilotos observadores e um mecânico de avião.

As condições meteorológicas no aeródromo de partida com estratos baixos e visibilidade reduzida.

Às 07H00 aproximadamente a aeronave sobrevoava “a zona de operações”, mas como aí as condições meteo eram más e com tendência a agravarem-se o operador decidiu regressar à Base, já com visibilidade muito reduzida.

Quando o avião sobrevoava a Serra Canzundo, bateu com a asa esquerda numa árvore, guinando para a esquerda, perdendo altitude e acabando por chocar com o solo a aproximadamente 30 metros da árvore onde havia embatido.

Após o choque com o solo, declarou-se incêndio no motor e nas asas.

Um dos pilotos observadores( António Carlos Dias dos Anjos ) conseguiu abandonar o avião, tendo mais tarde sido recolhido por pessoal que se encontrava próximo do local do acidente e conduzido à enfermaria do AB 3, donde depois foi evacuado para Luanda.

Toda a restante tripulação ( operador, piloto e mecânico ) faleceram no acidente.

4-CONCLUSÕES


Causa primária: desobediência consciente por parte do operador a determinações expressas do Comandante de Esquadra.

O Comandante de Esquadra havia-se ausentado na ante-véspera do dia do acidente e regressou no dia em que este ocorreu. A data de regresso do Comandante de Esquadra era do conhecimento do Operador.

O Operador ficou na ausência do Comandante de Esquadra , exercendo as funções de Oficial de Operações, tendo recebido do Comandante de Esquadra directivas no sentido de somente ser executada actividades de rotina, ficando-lhe completamente proibido o planeamento de missões por sua própria iniciativa pessoal.

O Operador ficou consciente da proibição, porquanto para a efectivação do bombardeamento previsto, pediu autorização ao Comandante da Unidade, ocultando no entanto , a proibição do Comandante de Esquadra, não tendo pedido autorização para a efectivação de missões de rotina, logo era porque tinha a consciência de que a missão prevista(bombardeamento com descolagem ao alvorocer) saía da rotina.

Aliás comentou com camaradas seus que o pedido de autorização se destinava a evitar qualquer acção por parte do Comandante de Esquadra.

A própria missão RESP estava expressamente proibida pelo Comandante de Esquadra, porquanto estava determinado que havendo dúvidas quanto às condições meteorológicas, se deve optar pelo cancelamento da missão.

Assim, na opinião da Comissão de Investigação, temos:

a) O planeamento de um bombardeamento a executar segundo moldes fora da rotina, criou nos pilotos que o iriam executar um clima de agressividade e ou excitação descontrolada.

b) Criou no Operador a ânsia de cumprir, a todo o custo, a missão que havia planeado, antes da chegada do avião onde vinha o Comandante de Esquadra.

c) Muito provavelmente afectou psicologicamente o Operador(aliás há um relatório médico onde refere alguma imaturidade no Operador),porquanto estava consciente de estar a desobedecer ao Comandante de Esquadra e a ludibriar o Comandante da Unidade.

Falha do Operador: por ausência de planeamento da missão RESP, má avaliação das condições meteorológicas e má decisão em querer continuar a voar em contacto visual com o terreno, quando as condições meteo existentes o deconselhavam, podendo ter optado por subir para uma altitude de segurança ou ainda melhor, aterrar no Qauítexe.

Falha de Surpevisão: ao insistir em prolongar a missão quando as condições meteo existentes, mesmo que viessem a possibilitar a passagem ao DO-27, eram impeditivas do cumprimento da missão por parte de uma formação de T-6 .

Há ainda falha de surpevisão do Operador ao permitir levar a bordo um piloto que seguia deitado numa maca e sem capacete e auscultadores, portanto quase que completamente alheio à missão e desnecessário.

Recomendação para a prevenção de acidentes

-Critério mais” apertado” na selecção de pilotos.

-Dotar a Esquadra Operacional da Unidade com maior número de pilotos experientes, Oficiais do Quadro Permanente e Sargentos Pilotos.

-Com o actual efectivo é impossível ter-se um enquadramento pelo menos aceitável e, o que é pior tendo a unidade dois destacamentos permanentes é impossível conseguir reunir em destacamento, um piloto experiente ou sensato , com um piloto menos experiente ou menos sensato.

Este é o RELATÓRIO PRELIMINAR DO ACIDENTE MAIOR, ocorrido no dia 20 de Dezembro de 1968 no Aeródromo – Base nº3 Negage.

Meu Comandante, restante Comando e toda a Linha da Frente, aqui fica sem qualquer comentário dos factos, o relato de mais um acidente com aeronaves da nossa FAP. Como sempre procuro introduzir a versão dos factos dos acidentes, com os relatórios oficiais de inquérito , elaborados pela Força Aérea.

Um grande Bem – Haja ao Víctor Sotero que com o seu sentido de pesquisa consegue sempre junto do AHFA todos os elementos e com a sua amizade e disponibilidade mos transmite..

Até ao próximo voo sobre acidentes.Estou a iniciar um que ocorreu com um Capitão Piloto Aviador de Monte Real que quando fazia treinos de tiro em Alcochete , faleceu a bordo de um F-86.

Saudações Aeronáuticas .

Jorge Mendes