Fernando
Moutinho
Cap.Pil.Av.
Alhandra
Victor, vou tentar
satisfazer a tua “pretensão” mas, espero que só utilizes o que te parecer
necessário. Não tenhas pejo em o fazer…
Começo por dizer que
o meu curso foi uma mistura de 2 soluções.
Os Cursos anteriores
ao meu (até Out de 1950), os candidatos a pilotos tinham de frequentar o Curso
de Mecânicos de Avião e no fim deste (6 meses) eram promovidos a 1º Cabos e
iniciavam a instrução de pilotagem. Os Cursos posteriores ao meu, os candidatos
a piloto iniciavam quase de imediato o Curso de Pilotagem.
E, o meu? Foi uma
mistura, isto é: também iniciamos com os futuros mecânicos mas, as aulas
práticas de motores e oficinas, foram substituídas por Meteorologia e Navegação
durante 3 meses. Passado este tempo, mantendo-nos como Praças, iniciávamos a
Pilotagem que durou 9 meses tendo terminado o Curso em 20 de Dezembro de 1952,
ainda como Praças. A promoção a 1º Cabo Piloto apareceu nos primeiros dias de
Janeiro.
Isto criou um facto
insólito – pilotos Praças
O meu Curso também
foi influenciado, muito fortemente, pela chegada de pilotos formados nos
Estados Unidos que, com a sua formação actualizada, incutiram nos novatos,
métodos de trabalho mais eficazes. Estou seguro ao afirmar que lhes devo em
grande parte, o desfiar da minha carreira aeronáutica.
Aqui lhes presto as
minhas homenagens.
Quanto ao Curso
propriamente dito posso dividi-lo em 3 fases.
Na 1ª Fase – Teoria sobre
Motores e respectiva mecânica, Aviões e
Aerodinâmica, Meteorologia, Navegação, Paraquedas (aprendemos a dobrar
paraquedas) para além da velha ginástica o Ordem Unida e… ver os aviões,
passando-lhes a mão pelo “pêlo”
Na 2ª Fase deixamos
umas cadeiras por outras. Exemplo: Morse, Tiro de Avião, etc.
Não queria ser
fastidioso porque julgo que a parte substancial, a dos aviões sai a seguir mas,
com factos pessoais.
Passar das teorias à
prática começando a voar…
Tiger Moth, onde
efectuei o 1º voo em 9 de Janeiro de 1952, tendo executado, até o último voo,
em 30 de Maio, 68:30 horas. Foi um avião muito interessante que deixou saudades
e, por ser rudimentar, incutiu-nos desembaraço.
Seguiu-se o T-6 em 3
de Junho até final do Curso. Por circunstâncias várias tive 3 instrutores mas,
um deles preparou-me muito bem em Voo por Instrumentos o que me foi muito útil.
Em 3 de Setembro o 1º
voo em Hurricane, tendo efectuado 22:10 horas.
O que dizer?
Simplesmente, um sonho voar em máquina tão célebre e prestigiante.
Eis um texto que foi
publicado na Revista Srius
1º Voo de Hurricane
Diga-se, antes de mais, que fiz o meu "baptismo de
voo" em 9 de Janeiro de 1952, num Tiger Moth com a matrícula 139, voei de
seguida num avião denominado T-6 Harvard, o nº 1613, no dia 3 de Junho do mesmo
ano e, finalmente, a 3 de Setembro efectuei o 1º voo no Hurricane nº 600.
Naquele tempo, as coisas não eram feitas com o rigor e o profissionalismo de
hoje, eram o paradigma do "desenrascanço". Assim, deram-me umas
páginas de papel, cópias de stencil, com uma breve descrição do avião mas, nada
ou quase nada sobre o comportamento do mesmo.
Falava na velocidade de perda com trem e flaps em baixo e com o avião limpo e,
ainda, nos limites do motor com algumas referências a regimes de cruzeiro e
subida, etc.
Na véspera do voo, um instrutor levou-me a sentar no cockpit e indicou-me como
fazer um arranque, como funcionava a alavanca do trem e dos flaps (era a
mesma), dos travões (pneumáticos), rádio e outros conselhos. Depois, disse-me
para continuar sentado a relembrar as explicações e memorizar o cockpit.
Dia seguinte, o primeiro voo.
Pela primeira vez coloquei o "mae-west" (colete salva -vidas),
paraquedas, o passe-montanha com os óculos facetados e a máscara de oxigénio.
Novidades estas que, associadas ao acionamento do comando da rádio (uma pequena
patilha na frente da máscara)com a cabine tipo vidros de janela, deram-me uma
sensação de estranheza e irrealismo que se acentuou quando, após o ”pôr em
marcha”, teria de fazer uma rápida rolagem, de acordo com as recomendações,
para evitar o perigo de aquecimento do glicol do sistema de refrigeração do motor.
Lá fui até ao princípio da faixa, obtive autorização da Torre, alinhei,
destravei, acelerei o motor, mantendo a direcção e, …no ar. Como? Não sei!
Motor para a frente, olhos na velocidade, tirar o avião do chão, recolher o
trem e flaps, foi já uma acção automatizada. Já no ar, seguindo as
recomendações, reduzi um pouco o motor e observando a velocidade, comecei a
subir. Num ápice, tinha atingido 16.000 pés. Foi quando comecei a tomar
consciência do se que se estava a passar. Nunca tinha estado tão alto.
Reduzi o motor, respirei fundo várias vezes e, após apreciar um pouco o que me
rodeava, que fazer? Principal preocupação, teria de aterrar. Mas, antes,
precisava de fazer algumas manobras para sentir o avião, incluindo perdas e
manobras para ajudar a “compreender” a máquina.
Entretanto fui descendo para 12.000 pés circulando sobre a Base pois não queria
perder o campo de vista, iniciei várias manobras para experimentar os comandos,
reacção do motor e as referidas perdas para sentir confiança na aterragem. As
primeiras sensações foram de admiração por ter nas mãos um avião tão dócil mas
ao mesmo tempo com garra. Aquele motor era uma maravilha. Que belo ronronar!
Por fim, tive de me deixar de devaneios e pensar em aterrar. Assim o fiz. Não
me perguntem, como? Correu tudo muito bem. Sinceramente, só dei por mim a tocar
o solo e a preocupar-me em manter a direcção, em virtude da dificuldade em se
ver para a frente (não esquecer que tinha roda de cauda). Rolagem rápida.
Estacionamento e, um acordar maravilhado pelo que tinha vivido. Tinham passado
40 minutos.
Foi a prova mais complexa de toda a minha vida de piloto. Ficou-me bem gravada
mas, valeu a pena! Bons tempos! Os voos seguintes foram para gozar o prazer de
voar numa máquina fabulosa.
Não me considero herói. A prova é que não fui só eu que passou esse teste,
todos os outros meus colegas de curso e muitos outros o passaram.Total de voo
efectuado: 22:10 horas

Curso de Pilotagem
terminado e brevetado em fins de Dezembro de 1952 e promovido a 1º Cabo.
Nos primeiros dias de Janeiro de 1953 fui colocado na B.A.2 – Ota, na Esquadra
10, onde voei no F-47D Thunderbolt.
Depois… T-33, F-84G,
F-86, etc…
Um grande abraço