segunda-feira, 22 de maio de 2017

Voo 3527 O TRAGÉDIAS




João Carlos Silva
Esp.MMA
Sobreda da Caparica





Primavera de 1980, com o símbolo da especialidade a brilhar nos ombros e com o desejado e merecido diploma nas mãos, o jovem mecãnico de avião estava pronto para novo rumo na sua curta carreira.
Passado um ano na base escola, lá pelas longínquas terras da Ota, o "velhinho" Primeiro Cabo Especialista iria rumar à Base Aérea nº6, Montijo, na margem Sul do Rio Tejo que banhava a sua cidade, a sua Lisboa, onde nascera e sempre vivera. Ia voltar para casa, pensava.

Com o sentimento do dever cumprido por ter passado mais esta prova e ter alcançado mais um objectivo, o jovem especialista apressou-se a delinear o trajecto diário que se avizinhava. Acabaram-se as semanas inteiras fora de casa. A poucos metros de casa, na Rua de São Lázaro, o amarelo da carris em direção à baixa lisboeta, para poupar uns segundos, saída em andamento na curva da Rua dos Fanqueiros para o Terreiro do Paço e passo apressado em direção à Doca da Marinha, para a "velhinha" lancha que todos os dias, incansável, já desde o início dos anos 60, várias vezes ao dia ligava as duas margens, da Lisboa velha cidade à Base da Aviação, outrora da Aviação Naval, apenas com alguns precalços causados pelos dias de nevoeiro ou pelos traiçoeiros bancos de areia em dias de maré muito baixa.
Assim, o "velhinho" Primeiro Cabo Especialista chegou à lancha e, encontrado o caminho para o porão da proa, onde viajavam os Especialistas, lá em baixo, nas catacumbas, abraçou com amizade os camaradas que com ele tinham conseguido a desejada colocação na Base Aérea nº6 e, à vontade, por ali se sentaram nos confortáveis bancos de ripas de madeira, alinhados, em fila.
Com o aproximar da hora de saída da lancha começaram a chegar os verdadeiros velhinhos, os Especialistas com vários anos de Força Aérea Portuguesa, alguns com comissões no Ultramar, no tempo da Guerra, os VCC. O "Tragédias" encarou-nos e, com ar de espanto por aquele abuso de por ali estarmos sentados à vontade, de imediato nos indicou os bancos junto às escadas de acesso e nos pôs no nosso lugar. Com o optimismo próprio da juventude, dos 18 anos acabados de fazer, rapidamente se cumpriu a viagem de travessia do Tejo, atracando toda a comitiva no cais de entrada da Base Aérea nº6, em tempos, antes de 1953, Centro de Aviação Naval Sacadura Cabral.
Naquele local, repleto de história da aviação militar portuguesa, dirigimo-nos ao edifício do Comando para a devida apresentação. O jovem mecânico trazia a secreta esperança de ser colocado na Esquadra 501, dos imponentes C-130, e assim juntar-se ao seu amigo e vizinho que um ano antes tinha percorrido os mesmos caminhos. Todos, os cerca de 28 jovens mecânicos, alinhados, no Comando, cada um com o seu sonho, com o desejo de trabalhar no seu avião de eleição.
Apresenta-se o Primeiro Cabo Especialista... começam a ser feitas as colocações, o coração acelera um pouco. Tu, tu tens cara de FIAT, vais para os FIATs (*).
E assim se inciaria uma nova etapa na carreira do jovem mecânico, uma curta carreira, mas, com raízes que ainda hoje perduram.

(*) FIAT G-91 R/3, R/4, T/3 na Esquadra 301 Jaguares, com o lema "De Nada A Forte Gente Se Temia"


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