sábado, 4 de agosto de 2007

Oficiais destes,PRECISAM-SE!

Luís Alves de Fraga
Coronel da Força Aérea (Reserva)
Diplomado Pela Academia Militar
Licenciado Ciências Politico-Sociais
Grau de Mestre em Estratégia
Prof.Inst.Altos Estudos Força Aérea
Prof.Efectivo Academia da Força Aérea
Prof.Ens.Sup.Inst.Mil.Pupilos do Exército
Prof.Aux.Universidade Autónoma Lisboa
Co-Autor diversas obras publicadas.






Caro Victor Barata
Foi com muito gosto que recebi o seu telefonema há alguns dias.Lastimo que nada lhe pudesse adiantar sobre a questão que me colocou.
Na verdade,em termos documentais,sobre a Guiné pouca coisa existe no Arquivo Histórico da Força Aérea (AHFA).
Sei,por ter feito parte da Comissão da História da Força Aérea(CHFA),que,neste momento há um oficial somente dedicado à elaboração do primeiro volume relativo à participação da Força Aérea na guerra em África,contudo,por enquanto,está a investigar e a escrever sobre Angola.
Nas duas comissões que cumpri - 1966/1969 e 1973/1975 - estive sempre colocado em Moçambique(3ªRA ou,como jocosamente,então,se dizia,na Região Aérea de 3ª).Passei uma única vez - em fins de Janeiro de 1969 - pelo aeroporto de Bissau no regresso da minha primeira comissão.Sobre o empenhamento da Força Aérea nessa província nada vi e nada conheci;tudo o que sei foi resultado de pesquisas e de conversas com pessoal militar que por lá andou.
Tenho,naturalmente,opinião formada quanto à situação operacional da Guiné.Sei que era o mais difícil teatro de operações no qual actuavam as tropas nacionais - fossem terrestres,navais ou aéreas.Esse facto deveu-se a diversos factores:a pequena dimensão do território(que possibilitava criar um efeito multiplicador aos efectivos da guerrilha,dada a proximidade às fronteiras protectoras dos Estados vizinhos);o melhor armamento dos guerrilheiros,a adversidade do clima e as particularidades da geografia(grande quantidade de rios e de braços de mar).Sei,também,que,sem grande margem para dúvidas,foi na Guiné que a Força Aérea teve um papel muito mais interventivo na condução das operações no terreno.A cobertura aérea tornava-se indispensável para quase todo o tipo de movimentações no solo,tal como era fundamental o apoio sanitário e logístico dado,respectivamente,pelos helicópteros e pelos DOs.
Fundamental foi,também,a substituição dos T-6 pelos Fiats G91 - embora aos primeiros estivesse sempre reservado um papel de apoio de fogo importante.
A prova real da superioridade das Forças Armadas Portuguesas naquele teatro de operações surgiu quando a guerrilha conseguiu introduzir os mísseis terra-ar como arma capaz de fazer vacilar o poder aéreo.Foi nessa data que a guerra deu uma reviravolta.Com ou sem medidas de protecção contra a actividade dos strella a balança da vitória pendeu claramente para o lado do PAIGC. As tropas portuguesas tinham aguentado até ao limite do possível.
Eu sei que há ainda muito boa gente a defender a ideia de que era possível voar sob a ameaça dos terríveis misseis!Mas o que esses heróicos defensores da liberdade das asas portuguesas se esquecem é que,havendo uma maior amplitude de misseis no território o abastecimento de aquartelamentos do Exército isolados no mato ficava automaticamente comprometido e isso,mais tarde ou mais cedo,corresponderia a ter de se fazer regredir o dispositivo de quadricula para zonas cada vez mais próximas de Bissau.Ora,numa guerra de guerrilhas,um território que se deixa de controlar é um território perdido(repare-se no esforço americano no Iraque;embora reforçado,cada vez mais,os meios militares no terreno as populações em luta continuam a ter a liberdade de acção e,por conseguinte,a terem superioridade operacional).
Se, por mera hipótese académica,a História não tivesse sido como foi,a guerrilha,na Guiné,teria deixado de actuar como força irregular para se assumir como força regular,passando no terreno.
Rapidamente o PAIGC passaria a ter apoio aéreo fornecido pelos países do bloco do Leste e,então,assistir-se-ia a um desastre militar semelhante aos dos Franceses na Indochina.Aos Portugueses só lhes restaria recuarem até ao mar e abandonarem,enquanto tal fosse possível,o território.
Caindo a Guiné,em breve espaço de tempo - talvez alguns anos...dois ou três - assistiríamos à divisão de Moçambique em quatro zonas distintas: o Norte,com domínio da Frelimo;a Zambézia,ainda em fase de subversão:o Centro,já fortemente dominado pela guerrilha;e,por fim,o Sul em ambiente de tensão politica e militar.
Conseguir vitórias locais seria relativamente fácil à guerrilha desde que obtivesse,também,o fornecimento de misseis antiaéreos.A breve trecho ter-se-iam de encetar negociações com a FRELIMO para se encontrar uma plataforma de entendimento.Esse seria o passo para em Angola haver uma mudança operacional que conduziria ao recuo da toda a capacidade de resistência das tropas portuguesas.
Na minha perspectiva,depois da queda da Guiné,em mais 6 ou 7 anos,toda a África portuguesa teria claudicado e entraria em ruptura politica com a Metrópole - ou porque os movimentos guerrilheiros tinham tido capacidade para se imporem,ou porque as populações europeias,através de lideres políticos locais,se teriam entendido com os movimentos de independência e sacudiriam a autoridade portuguesa.
Mas tudo isto não passa de conjecturas,porque a História é o que foi e não o que poderia ter sido. Todavia,uma coisa é certa:era na Guiné que residia a chave da solução militar ou politica de uma guerra que consumiu vidas e meios materiais por mera teimosia de um Governo que não quis compreender que os povos também crescem e se emancipam,tal como os filhos dentro de uma família.
Foi um prazer poder partilhar esta dissertação consigo e com todos os leitores deste simpático blog.


Luís Fraga

VB- Na expectativa de encontrar resposta para uma pergunta que um companheiro me solicitou,procurei o Luís Fraga(desculpe tratá-lo assim)que,sem o conhecer mas por indicação de terceiros,talvez fosse o pessoa indicada.Não foi,mas o dialogo que mantive com ele deixou tão feliz como se me tivesse a referida informação.
Na vida militar nunca tive o prazer de conviver com ele,mas era,e é,deste tipo de oficiais superiores que as nossas forças militarizadas deviam ter.
Apesar do seu riquíssimo curriculum,não deixa de transmitir nas suas palavras a sua grande humildade.Na sua escrita, que tive oportunidade de ler,
é lindo apreciar toda a sua imponência intelectual.
Bem-Haja companheiro,ficamos a aguardar o seu enriquecimento deste nosso espaço que,a partir deste momento o considera membro da Tertúlia LINHA DA FRENTE.

Victor Barata

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