terça-feira, 4 de maio de 2010

VOO 1681 A CADA UM.






António Loureiro

Fur.Mil.Polícia Aérea
Figueira da Foz


Dá-me licença senhor Comandante

Ao ler a mensagem do nosso camarada António Dâmaso, vieram-me à ideia uma série de pequenos episódios e é precisamente por isso que este blog tem uma importância relevante nas nossas vidas.
Estava eu em intervenção na Macossa, terrenos da área do Régulo Sanhamanga, que confinava com a área da Gorongosa, Moçambique.
Apesar de ser uma zona bastante seca, abundavam manadas de caça grossa como elefantes, zebras etc, que por vezes nos obrigavam a parar para as deixar atravessar a picada, aliás, aqueles terrenos estavam concessionados às Coutadas da Safrique.
Antes da FRELIMO ter descido a sua acção até aquelas paragens em finais de 1972, aquilo era um autêntico Paraíso.
Na época das chuvas a coisa chiava mais fino, porque para fazermos os 80 Km de picada, chegávamos a demorar mais de 24 horas e tínhamos que trabalhar que nem "moiros" para ultrapassarmos com êxito os diversos "atascansos".
Porque o calor era tórrido, eu improvisei o meu posto de rádio debaixo de um parrô (espécie de palhota sem paredes) onde fazia as explorações de comunicações com o E/R-RACAL TR28.
Para não ter muito trabalho, a antena de árvore ficava ficava sempre no sítio e após o final da exploração, desligava-a e pendurava-a disfarçadamente num dos paus que segurava o "telhado" de capim.
Numa das vezes, quando vou para ir buscar a antena, apanhei um cagaço que ía morrendo, por pouco que não agarrei uma cobra comprida e fina, com a cabeça triangular e às manchas castanho escuro na sua cor castanho claro, se ela não tivesse deitado a língua de fora, tenho a impressão que a agarrava sem querer, tal era a sua camuflagem.
Recuei uns metros, fixei o raio da cobra e fiquei ali num dilema sem saber bem o que fazer.
Como um Furriel, meio "maluco", gostava muito de cobras, que até chegou ao ponto de as apanhar e guardá-las numa jaula improvisada que ele tinha feito, mandei-o chama para ele a vir buscar, pois o que eu queria era ver-me livre dela.
De vez em quando havia alguma que lhe fugia e aquilo era um pandemónio, andávamos todos "arrásca" por não saber onde é que o raio da cobra andava.
Certa vez, armado em herói, pensando que já tinha domesticado uma cobra cuspideira, pôs-se a armar em parvo e a cobra pimba, mandou-lhe uma cuspidela para um olho, se não fosse uma intervenção rápida e lavarem-lhe o olho com soro fisiológico, tinha ficado cego, mas penso que ainda ficou com problemas.
Como ele estava a tratar de um assunto qualquer e não me pode atender, eu tive que aguentar ali um bom bocado, a verdade é que eu também estava com medo de sair dali e perder a cobra de vista.
Já farto de esperar, fui buscar a G3, mas quando cheguei, já a cobra não estava no mesmo sítio, obrigando-me a ficar ali de plantão para ver se a descobria.
Quando finalmente voltei a vê-la, para não falhar, quase que lhe encostei o tapa-chamas à cabeça e mandei-lhe um tiro.
Como a cobra não caiu, andava eu um bocado acagassado com um pau a mexer o capim, quando me aparece o dito Furriel que ouviu o tiro, largou o que estava a fazer, e veio a correr para o pé de mim a perguntar-me o que tinha acontecido e eu expliquei-lhe.
Qual não é o meu espanto, o rapaz perdeu a estribeira e meio a choramingar, parecia um doidinho à procura da porcaria da cobra.
Quando finalmente a encontrou, já morta, teve uma reacção violenta contra mim por eu ter dado o tiro e que podia muito bem ter esperado mais um bocado, que a cobra era muito bonita e depois de uma azeda troca de argumentos, mandei-o embora, mas estava a ver que a coisa dava para o torto, nunca tinha visto uma coisa assim por causa de uma cobra.
Enfim, há gostos para tudo, mas a verdade é que eu tive que mudar de sítio para fazer as explorações porque estava sempre com a sensação que havia cobras no teto.
Aquele gostava mesmo de cobras vivas.
1 abração