sexta-feira, 2 de julho de 2010

Voo 1812 DC 3 (DAKOTA) QUE GRANDE MÁQUINA.





António Loureiro
Fur.Mil.PA
Figueira da Foz




Dá-me licença senhor Comandante
DC-3 - GRANDE MÁQUINA


Dá-me licença senhor Comandante
Ao ver a primeira fotografia "sorripiada" pelo nosso camarada Ramos, dum DC-3, fez-me vir à ideia um episódio passado no interior duma dessas infernais máquinas voadoras.

Legenda: O DC 3,Dakota,estacionado na placa da BA 12,Bissalanca.
Foto:Costa Ramos(direitos reservados)

Um pequeno grupo de "Conselheiros" ( chamam cada nome às coisas ) embarcamos de Gweru - Rodésia para Kinchasa, fazendo escala por Lumbumbaxi - Rep. Democrática do Congo, onde chegamos já de noite.
O avião, ultra-velho, pilotado por 2 belgas, era de carga, aproveitando nós os poucos espaços disponíveis para nos sentarmos ou deitarmos em cima dos caixotes.
Como o pessoal andava na ordem dos vinte e tal anos, aquilo era uma "festa", apenas o nosso amigo Quintino, enjoado que nem um porco, dizia mal da sua vida e desesperado de tantas vezes ter feito o percurso para o que chamavam WC, último recato ao fundo da aeronave, para deitar fora os ácidos esverdeados que o faziam chorar, a determinado ponto não aguentou mais e, estando marimbando-se para si e para os outros, ajoelhou e começou a pedir a Deus e todos os santinhos que fizesse cair o avião para se livrar daquele sofrimento.
O pessoal quase que lhe batia e não sei se ficou algum nome bonito para lhe chamar, mas ele não queria saber disso para nada e lá estava com as mãos levantadas na sua súplica.
Para o chamar à razão, houve logo quem se prontificasse a abrir a porta para ele se mandar do avião para fora, mas isso, como é evidente, era só acção psicológica.
Quando chegamos ao aeroporto, lá estava a limousine à nossa espera, uma camioneta de carga para nos transportar para o que na tabuleta chamavam pomposamente de Hotel.
Como não havia luz, se calhar era mesmo assim, lá nos indicaram um corredor onde estavam os quartos, à luz dos isqueiros, logo constatámos que aquilo era uma imundice pegada e nem o camuflado tivemos coragem para tirar e tentamos descansar qualquer coisa porque no dia seguinte a viagem continuaria.
Não tardou muito para o alvoroço se instalar, logo que os percevejos detectaram sangue quente, fizeram um ataque cerrado às suas "presas", apenas dominados por o que havia de papel transformados em archotes e às chamas dos isqueiros, mas foi sol de pouca dura, porque a segunda linha avançou de imediato e tivemos que abandonar as instalações, vindo-nos deitar no passeio e por onde calhava, era preferível sermos picados pelo mosquitos do que mordidos pelos percevejos.
Pela manhã, embarcámos outra vez no DC-3 para seguir viagem, desta vez o pobre Quintino, embora abalado, portou-se melhor.
Chegados ao aeroporto de Kinchasa, nova situação embaraçosa, aos pares, eu e o meu amigo Oliveira fomos os primeiros a passar pela "sanidade" onde um enfermeiro, depois de consultar os nossos certificados internacionais de vacinação, disse que não estavam em dia e, por mais que lhes disséssemos que ele estava errado, não adiantou, e foi à vitrina buscar uma grande seringa que encheu com um líquido qualquer.
Acagaçado, em português, lá disse ao Oliveira, oh pá olha que esse gajo vai-nos espetar, temos que fazer qualquer coisa e aproveitamos enquanto ele estava a tirar o ar da seringa para meter 10 zaires cada um dentro do certificado e insistir com ele para ver melhor, por fim ele lá cedeu, retirou o dinheiro, meteu o líquido na pia, pôs o carimbo, assinou e todo sorridente entregou-nos os documentos desejando-nos boa estadia.
Agradecemos também "simpáticamente" e passamos logo a palavra ao pessoal e tudo acabou em bem com o enfermeiro com a carteira recheada.
Enfim, é a vida.
Um abração a toda a Linha da Frente.