quarta-feira, 13 de abril de 2011

Voo 2248 O DESTACAMENTO DA FAP EM NOVA LAMEGO.






Gil Moutinho
Fur.Mil.Pil
Gondomar




Amigo Victor e todos os outros
Para começar, quero prestar as sinceras condolências à família e amigos do Élio Mesquita.
Convivi com ele em 74/75,na base de S.Jacinto, quando me encontrava a dar instrução básica
em T6,após o regresso da Guiné. Ele já estava numa situação de “pré-reforma”,ia fazendo os
mínimos, e estava sempre disponível para ocupar um lugar nas formações de 4 aviões e quando
não havia pilotos suficientes. Tinha uma postura elegante e era um típico cavaleiro dos ares, e
sempre com o lenço amarelo no pescoço e os inseparáveis Ray-Ban colocados.
O defeito ,era ser um fumador compulsivo.
Voltando a Nova Lamego, para além de contar as minhas experiências, também fazer algumas
considerações “em jeito”de comentário ao post 7807 do nosso Tenente Matos, publicado na
Tabanca Grande.
Já foi referido que por um período de 1 semana, eram destacados meios aéreos para N.Lamego,
que consistiam em uma DO, um Héli e um Héli canhão, com três pilotos, dois mecânicos e um
atirador do canhão(não sei se foi sempre assim e desde quando)
Curiosamente na minha caderneta de voo (é o único auxílio da minha memória)contactei que, quase
em fim de comissão, fiz duas semanas seguidas, não me recordando minimamente das razões para tal.
Tudo isto para que houvesse proximidade às Tropas no terreno e evitar as demoras de uma
deslocação da Base.
Só era destacado um piloto, quando já tivesse alguma experiência do TO da Guiné, e quase sempre
um miliciano, pois os do quadro, mais velhos(não necessariamente mais experientes no Ultramar)tinham
quase sempre família e residiam na cidade.
Se a memória não falha, um dos pilotos teria que ser sempre um oficial (faria parte das NEP’s),
mesmo que não fosse mais antigo e experiente no TO.
A FA estaria assim à altura, com oficialato, para dignas relações com as FT e respectiva colaboração
sendo de véspera programado toda a actividade aérea ,excepto para as evacuações por motivos óbvios.
A excepção eram as evacuações, pela manhãzinha, porque de véspera já não era possível.
O meu primeiro contacto com o Leste, ainda muito pira, foi numa viagem a Pirada e ia correndo tudo muito
mal (ver post 1040 neste blog).
Eu de DO, para além de evacuações, deslocava-me onde fosse necessário e por indicações das chefias
das FT em sintonia com as regras acordadas para a colaboração com a FA.
Nessas viagens, habitualmente eram visitadas as Companhias na mato a partir da sede do Batalhão
pelo Comandante respectivo, e para além deste transportávamos víveres frescos, carga geral e o sempre
apreciado correio, para além de outros militares em deslocação.
As viagens eram sempre de curta duração e mesmo acumuladas dificilmente esgotavam as horas disponíveis.
Quando tínhamos evacuações é que se fazia muitas horas de pilotagem, pois cheguei no mesmo dia
a ir duas vezes a Bissau e tudo somado a perfazer 5 horas seguidas.

Claro que à noite, porque estávamos soltos, se calhar nos excedíamos do normal.
A manhã podia começar com o pequeno almoço na varanda do Mounir, quase em frente dos nossos alojamentos.
onde se começava com ovos mexidos e salada de tomate, acompanhado com chá frio,e café com mezinha.
Por vezes tínhamos sobremesa com fruta fresca e chocolate (onde é que já ouvi isto?)nos fundos do
estabelecimento do nosso amigo(só nos recomendava que lavássemos com sabão no fim).

Também aqui ele cozinhava ,eventualmente, alguma caça que o canhão abatia para os esfomeados.
Insiro uma foto esclarecedora (soldado condutor do Exército,Olímpio,eu,Direitinho,Vítor Afonso e Cardosode cócoras, falta o mecânico da DO,podia ser o Falcão,Pascoal ou outro)
Nunca me preocupei com o excesso de horas para além do pré definido, eu gostava muito de voar ,com
20/21 anos tudo é possível,e percebia que o meio aéreo era importante para as tropas no terreno.Nunca me
senti usado com excesso de horas,pois em todos os momentos éramos comandantes da aeronave e tínhamos regras bem definidas para cumprir se o quisesse, e tinha o manche na mão(faca e queijo).
Nunca me senti um rapazito,sim um rapazinho que tendo feito 20 anos a 5 Março 72,embarquei a 6 Abril
Tinha contudo uma formação de cerca de ano e meio de cursos e tirocínios, rigorosamente igual à dos oficiais do mesmo curso, base para evolução adquirida na permanência na Guiné.Tinha mais valia a experiência
e capacidade de cada um ,que propriamente o posto.Recentemente, eu como muitos outros, comecei a conviver ,nos blogs ,tabancas e tertúlias, com outros ex Combatentes de outras armas, nomeadamente do Exercito, e comecei a conhecer melhor a realidade dos apelidados “burakos”,o que na época não aconteceu pois muitas vezes nem chegava a parar o motor do avião(nas evacuações acontecia)ou permanecíamos pouco tempo,não havendo tempo para grandes convívios sendo sempre muito bem recebido,um reconhecimento da nossa colaboração,nomeadamente nas evacuações e transporte de correio.Havia locais(burakos) que nos recebiam duma maneira quase surreal.Lembro-me de Guileje onde nos recebiam com bebidas na pista(nada de álcool),pensava eu que um barmen de casaca branca, mas o Cor. Coutinho disse-me que era uma bajuda. Do libré tenho a certeza, não sei onde,Alguém me ajuda?

Na base de Bissalanca.o SPM(serviços postais militares)tinha permanentemente um camião, estrategicamente estacionado, e sempre bem fornecido, que atento às movimentações de saídas de aeronaves nos solicitava o transporte de correio em sacos para os nossos destinos.
Agora olho com mais respeito e admiração para estes combatentes de todos os “burakos” da Guiné.
Fui educado,em novo, a respeitar os pais,os mais velhos,os professores e as autoridades,e na tropa os superiores.Agora respeito mais os outros valores:competência,personalidade, honestidade, etc e não os galões, títulos ,canudos e cargos imerecidos.
Isto vem a propósito do malogrado T.Cor Brito,onde para além do posto, também era competente e justo.
Um dia também me atrasei no começo de uma missão, cerca de meia hora a mais de cama,não em destacamento,e na chegada da mesma fui confrontado pelo meu chefe de esquadra, cap x,e a minha desculpa não foi aceite,mesmo tendo cumprido a missão na íntegra. Resultou na perda de uma viagem extra, bónus,de Nord à Metrópole,que por escala e antiguidade, era concedida aos pilotos e outros, para alguns lugares disponíveis, e mesmo sendo cansativa, sempre eram alguns dias em casa.
Na altura fiquei triste e tentei demover da decisão o chefe do Grupo Operacional T.C.Brito.Andei dois dias a rondar o seu gabinete sem coragem para o abordar( Os chefes,o respeito e a timidez!).Não consegui e só mais tarde é que aceitei e compreendi que ele não iria alterar a decisão/recomendação do Capitão.Respeitava-o como homem e como chefe.

Um abraço

Gil Moutinho

VB: Olá Gil.
Que linda e real descrição fazes do destacamento de Nova Lamego neste humilde e “entusiasta” Blog onde o elitismo não é reconhecido.”CADA MACACO NO SEU GALHO”
Obrigado.