José Ribeiro
Esp.OPC
Lisboa
Companheiro de armas, Victor.
Por aquilo que tenho lido no nosso Blog sobre a Guiné e que retrata
uma determinada realidade encontrada por nós e especialmente por ti,e
considerando que:
-Estive na BA12,no período de 09.10.68 a 14.07.70;
-Provavelmente e quase de certeza que as condições de Guerra
e logística foram diferentes daquelas que eu encontrei, isto
é, foram outros tempos, sendo que em termos de guerrilha as que encontraste
foram piores;
-Quando cheguei á Base os meios aéreos existentes era o velhos
T6G,DO27 e Dakota. Só mais tarde chegaram os Fiat,s G91;
-O tempo passado neste "Teatro" de Guerra foi terrível, nunca
mais me ei-de esquecer dele.
Assim começando por falar daquilo que eu assisti em termos de
alimentação dir-te-ei que, era uma miséria. Quando fui pela primeira
vez ao refeitório, fiquei com uma fome dos diabos, não comi nada, mas o
espectáculo ficou-me na retina(cabeças de peixe com cigarros a arder na boca e
arroz colado ao tecto do referido refeitório).
Os nossos camaradas mais velhos matavam a fome com cerveja o que levava a que
fossem evacuados para Lisboa com destino ao hospital com doenças
do fígado, era uma forma de deixarem a Guiné!
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As valetas das ruas da Base, estavam
sempre cheias de garrafas de cerveja vazias, o que levava a que quando havia
ataques simulados á Base, muitos dos nossos camaradas fossem parar á enfermaria
com feridas, porque segundo as instruções de defesa que nós somos obrigados a
cumprir, passava por sair das camaratas e nos meter-mos nas valetas.
Com a chegada e inicio de funções do Coronel Pilav. já falecido, Diogo
Neto(foi no mesmo avião que eu),começou por se inteirar do que se estava a
passar, já que entravamos no refeitório para não comer. Sendo que e passado
pouco tempo deixamos de ir ao refeitório,o que criou alguns problemas ao
Capitão encarregue dos refeitórios,somente a Polícia Aérea e o
Serviço Geral,porque tinham que fazer formatura,iam.
Para resolver o problema o Comandante da Base,demitiu o Capitão encarregue dos
refeitórios e nomeou outro.A partir dessa altura passamos a ter uma alimentação
muito melhor e era-mos tratados doutra forma(o capitão perguntava-nos o
que queríamos comer),
sendo que por volta das onze horas da manhã tínhamos direito a
entrada que consistia em carnes verdes e sumos.
Foi nessa altura que foi reconstruído o bar,parecia mais
um Pub que outra coisa.Também foi nessa altura que começaram a
construção das infraestrutura desportivas e do novo Centro de
Comunicações,Nunca lá operei,já que somente ficou operativo em
1970,altura em que me vim embora,com destino ao GDACI-Monsanto.
Daquilo que tenho lido sobre a guerra,especialmente no que diz respeito às
condições ,clima
e dificuldades devidas á morfologia do terreno.
Se quanto á guerra o que íamos encontra,relativamente á agressividade do
clima ninguém nos disse nada.
É um facto que sofremos na carne a teimosia daqueles que mandavam no país na
altura,isto é,fomos vitimas de más politicas praticadas nesse tempo e hoje
ainda estamos a sofrer,noutro aspecto,outra também gravosas e sem
sentido.
Recordo-me,não sei se 1969 se em 1970,se uma viagem que o
General Spinola fez a Lisboa,esteve ausente da Guiné um mês,constando
que tinha sido preso por querer dar a independência,com negociação
com Amílcar Cabral,por se julgar na altura que
nunca íamos vencer a guerra.
De vez em quando havia festa na Base em que actuava o conjunto "A Voz de
Cabo Verde" e num certo dia disseram-nos que a Amália Rodrigues e outros
artistas,iriam lá actuar,ficamos muito satisfeitos,simplesmente essa actuação
não se chegou a realizar,porque tinha havido um massacre de um
dos majores e,se não estou em erro,capitães e motoristas,para os
lados de Serpa Pinto,pela Fling,outro movimento existente na Guiné.Iam ter
uma reunião com o o PAIGC,aliás ,oGen.Spinola,tinha reuniões de vez enquanto
com eles.Quase todas as manhãs sai de Helicóptero,cujo o piloto era
oSarg.Honório,caboverdiano,já falecido.
Do "Teatro" de guerra na Guiné,no período que lá
esteve,assisti a ataques constantes dos chamados"terroristas",ataques
esses que não ficavam sem resposta,quer pela Força Aérea,incluindo
os paraquedistas,quer pelas outras forças no terreno.Foram milhares de
toneladas de bombas as lançadas e,também,material de guerra apreendido aos
guerrilheiros,possuía fotografias desse material.Nesse período,os
guerrilheiros já possuíam
misseis terra-ar o que se tornava difícil para os meios aéreos no
terreno,Felizmente nenhum avião foi abatido,porque havia
constantes bombardeamentos diurnos e nocturnos ás bases dos
guerrilheiros,especialmente Madina de Boé,onde eles declaram
a independência e outras localidades
como,Guileje,Gadamael,Farim e ainda outras que não me recordo do
nome.
Lembro o Cap.Pilav.Nico,actualmente Gen.Pilav.,que não dava descanso
aos Fiat,s,muitas vezes,quando estava de serviço ás
operações,comunicava ao dito,que havia ataques em tal sitio,ele pedia
autorização ao Comandante Diogo Neto e/ou era eu a solicitar,por ordem
dele,autorização para levantar voo com o Fiat G91.Era certo
que mal ele levantava da pista acabava o ataque,o que induz que havia
informadores infiltrados na BA12 ou na proximidade,aldeia
de Bissalanca.
De qualquer forma pelo andar da carruagem,tinha-se a noção de que a guerra ia
acabar o mais rápido possível.Não foi mais cedo porque Lisboa não deixou e nós
é que pagamos as favas.
Lembro-me,também,do Dr.Couto e outro que não me recordo agora,nessa altura já
se falava na mudança de regime,e este na consulta era muito discreto
a esse respeito.A consulta durava,ás vezes,uma hora,a doença
tal(...).
Depois de ter estado na Guiné e regressado a Lisboa,e quando passei á
disponibilidade,fui para Angola,país com riquezasnaturais
incalculáveis,onde vivi cerca de 3 anos.
De uma realidade conhecida por nós em termos de sociedade,refiro-me á
Guiné,encontrei outra desenvolvida e com um futuro promissor,sendo que
foi destruída de um momento para o outro.Auguro bom futuro para esse
País,mas julgo que nem daqui a 100 anos atingirá aquilo que
tinha atingido a nível social e económico(mais um erro
politico que se chamadescolonização á pressa).
Grandes promoções e tachos surgiram á nova classe,entretanto aparecida do nada
e que ainda se deleitam dos benefícios recebidos(é a classe politica e seus
tentáculos).
Como falatório já está a ficar extenso,assim me despeço.
Saudações especiais para o camarada de armas ,Victor Barata.
Até ao dia 6 de Outubro,quando chegar a Leiria telefono,porque não sei ,o
Restaurante fica na localidade da Barreira.
José Luís Monteiro Ribeiro
OPC 3ª/66