sexta-feira, 27 de abril de 2012

Voo 2847 AQUELE AR QUENTE...





José Ribeiro
Esp.OPC
Lisboa





Companheiro de armas, Victor.
Por aquilo que tenho lido no nosso Blog sobre a Guiné e que retrata uma determinada realidade encontrada por nós e especialmente por ti,e considerando que:
-Estive na BA12,no período de 09.10.68 a 14.07.70;
-Provavelmente e quase de certeza que as condições de Guerra e logística foram diferentes daquelas que eu encontrei, isto é, foram outros tempos, sendo que em termos de guerrilha as que encontraste foram piores;
-Quando cheguei á Base os meios aéreos existentes era o velhos T6G,DO27 e Dakota. Só mais tarde chegaram os Fiat,s G91;
-O tempo passado neste "Teatro" de Guerra foi terrível, nunca mais me ei-de esquecer dele.
Assim começando por falar daquilo que eu assisti em termos de alimentação dir-te-ei que, era uma miséria. Quando fui pela primeira vez ao refeitório, fiquei com uma fome dos diabos, não comi nada, mas o espectáculo ficou-me na retina(cabeças de peixe com cigarros a arder na boca e arroz colado ao tecto do referido refeitório).
Os nossos camaradas mais velhos matavam a fome com cerveja o que levava a que fossem evacuados para Lisboa com destino ao hospital com doenças do fígado, era uma forma de deixarem a Guiné!







As valetas das ruas da Base, estavam sempre cheias de garrafas de cerveja vazias, o que levava a que quando havia ataques simulados á Base, muitos dos nossos camaradas fossem parar á enfermaria com feridas, porque segundo as instruções de defesa que nós somos obrigados a cumprir, passava por sair das camaratas e nos meter-mos nas valetas.
Com a chegada e inicio de funções do Coronel Pilav. já falecido, Diogo Neto(foi no mesmo avião que eu),começou por se inteirar do que se estava a passar, já que entravamos no refeitório para não comer. Sendo que e passado pouco tempo deixamos de ir ao refeitório,o que criou alguns problemas ao Capitão encarregue dos refeitórios,somente a Polícia Aérea e o Serviço Geral,porque tinham que fazer formatura,iam.
Para resolver o problema o Comandante da Base,demitiu o Capitão encarregue dos refeitórios e nomeou outro.A partir dessa altura passamos a ter uma alimentação muito melhor e era-mos tratados doutra forma(o capitão perguntava-nos o que queríamos comer),
sendo que por volta das onze horas da manhã tínhamos direito a entrada que consistia em carnes verdes e sumos.
Foi nessa altura que foi reconstruído o bar,parecia mais um Pub que outra coisa.Também foi nessa altura que começaram a construção das infraestrutura desportivas e do novo Centro de Comunicações,Nunca lá operei,já que somente ficou operativo em 1970,altura em que me vim embora,com destino ao GDACI-Monsanto.
Daquilo que tenho lido sobre a guerra,especialmente no que diz respeito às condições ,clima
e dificuldades devidas á morfologia do terreno.
Se quanto á guerra o que íamos encontra,relativamente á agressividade do clima ninguém nos disse nada.
É um facto que sofremos na carne a teimosia daqueles que mandavam no país na altura,isto é,fomos vitimas de más politicas praticadas nesse tempo e hoje ainda estamos a sofrer,noutro aspecto,outra também gravosas e sem sentido.
Recordo-me,não sei se 1969 se em 1970,se uma viagem que o General Spinola fez a Lisboa,esteve ausente da Guiné um mês,constando que tinha sido preso por querer dar a independência,com negociação com Amílcar Cabral,por se julgar na altura que nunca íamos vencer a guerra.
De vez em quando havia festa na Base em que actuava o conjunto "A Voz de Cabo Verde" e num certo dia disseram-nos que a Amália Rodrigues e outros artistas,iriam lá actuar,ficamos muito satisfeitos,simplesmente essa actuação não se chegou a realizar,porque tinha havido um massacre de um dos majores e,se não estou em erro,capitães e motoristas,para os lados de Serpa Pinto,pela Fling,outro movimento existente na Guiné.Iam ter uma reunião com o o PAIGC,aliás ,oGen.Spinola,tinha reuniões de vez enquanto com eles.Quase todas as manhãs sai de Helicóptero,cujo o piloto era oSarg.Honório,caboverdiano,já falecido.
Do "Teatro" de guerra na Guiné,no período que lá esteve,assisti a ataques constantes dos chamados"terroristas",ataques esses que não ficavam sem resposta,quer pela Força Aérea,incluindo os paraquedistas,quer pelas outras forças no terreno.Foram milhares de toneladas de bombas as lançadas e,também,material de guerra apreendido aos guerrilheiros,possuía fotografias desse material.Nesse período,os guerrilheiros já possuíam
misseis terra-ar o que se tornava difícil para os meios aéreos no terreno,Felizmente nenhum avião foi abatido,porque havia constantes bombardeamentos diurnos e nocturnos ás bases dos guerrilheiros,especialmente Madina de Boé,onde eles declaram a independência e outras localidades como,Guileje,Gadamael,Farim e ainda outras que não me recordo do nome.
Lembro o Cap.Pilav.Nico,actualmente Gen.Pilav.,que não dava descanso aos Fiat,s,muitas vezes,quando estava de serviço ás operações,comunicava ao dito,que havia ataques em tal sitio,ele pedia autorização ao Comandante Diogo Neto e/ou era eu a solicitar,por ordem dele,autorização para levantar voo com o Fiat G91.Era certo que mal ele levantava da pista acabava o ataque,o que induz que havia informadores infiltrados na BA12 ou na proximidade,aldeia de Bissalanca.
De qualquer forma pelo andar da carruagem,tinha-se a noção de que a guerra ia acabar o mais rápido possível.Não foi mais cedo porque Lisboa não deixou e nós é que pagamos as favas.
Lembro-me,também,do Dr.Couto e outro que não me recordo agora,nessa altura já se falava na mudança de regime,e este na consulta era muito discreto a esse respeito.A consulta durava,ás vezes,uma hora,a doença tal(...).
Depois de ter estado na Guiné e regressado a Lisboa,e quando passei á disponibilidade,fui para Angola,país com riquezasnaturais incalculáveis,onde vivi cerca de 3 anos.
De uma realidade conhecida por nós em termos de sociedade,refiro-me á Guiné,encontrei outra desenvolvida e com um futuro promissor,sendo que foi destruída de um momento para o outro.Auguro bom futuro para esse País,mas julgo que nem daqui a 100 anos atingirá aquilo que tinha atingido a nível social e económico(mais um erro politico que se chamadescolonização á pressa).
Grandes promoções e tachos surgiram á nova classe,entretanto aparecida do nada e que ainda se deleitam dos benefícios recebidos(é a classe politica e seus tentáculos).
Como falatório já está a ficar extenso,assim me despeço.
Saudações especiais para o camarada de armas ,Victor Barata.
Até ao dia 6 de Outubro,quando chegar a Leiria telefono,porque não sei ,o Restaurante fica na localidade da Barreira.
José Luís Monteiro Ribeiro
OPC 3ª/66

1 comentário:

  1. -Caro amigo Ribeiro,confirmo tudo o que esta escrito, também estive nessa fase na BA12, cheguei a 01/10/1968 e sai p/ a BA7 em 17/05/1970.Tenho fotos no meu FB https://www.facebook.com/media/set/?set=a.117612538270915.11580.100000665073252&type=3
    Um abraço, António da Silva Vieira

    ResponderEliminar