LUXO NOS BIJAGÓS
A francesa Solange Morin, proprietária
do Ponta Anchaca na ilha de Rubane, assegura o transporte dos turistas ao seu
hotel em avião privado
Os pacotes para a Guiné-Bissau serão
lançados até à BTL, feira do turismo de Lisboa, como resultado da primeira
viagem de reconhecimento do destino que envolveu a maioria dos produtores de
viagens
Foi, literalmente, uma descoberta para
os operadores turísticos portugueses. A primeira 'fam trip' à Guiné-Bissau de
'construtores' de programas de viagens promovida pela Euroatlantic de 6 a 11 de
janeiro — onde participaram a Abreu, Solférias, Soltrópico, Sonhando, Clube
Viajar, You e Across, que representam 80% da operação turística nacional — irá
resultar na criação de pacotes de férias, de uma semana a 10 dias, a lançar já
na próxima BTL (Bolsa de Turismo de Lisboa), a feira que decorre na FIL de 15 a
19 de março e que é a principal montra do turismo português.
Para os operadores turísticos, a
'pérola' deste destino novo são os Bijagós, arquipélago com 88 ilhas ao largo
da Guiné-Bissau e que é um santuário natural (tem os únicos hipopótamos
marinhos do planeta, entre uma grande diversidade de vida animal, como
tartarugas ou chimpanzés).
"O nosso objetivo é fazer um
turismo de qualidade e controlado tendo em conta o ecossistema que existe em
Bijagós, cujo potencial é muito aprazível para o turismo que o mundo hoje
procura", salientou Fernando Vaz, ministro do turismo da Guiné-Bissau ao
receber os operadores turísticos, a quem fez o apelo de criar um produto de
férias "para que os portugueses também venham à Guiné onde vão sentir-se
em casa, e não só ao Algarve".
O ministro guineense frisou ainda que
"o nosso turismo ainda é incipiente, recebemos 30 mil turistas por ano, e
queremos aprender com Portugal. Se Cabo Verde conseguiu tornar-se um destino
reconhecido nós também vamos conseguir".
MAR DE ILHAS. O arquipélago de Bijagós,
ao largo da Guiné, integra 88 ilhas em estado natural, o que é considerado um
paraíso para eco-turismo
Para a Abreu Viagens, a Guiné tem todas
as condições para "funcionar como um destino novo" de lazer, quando
até à data era "desconhecido" dos turistas portugueses, conforme destaca
Leonor Ramos, gestora do produto África do operador turístico, que participou
nesta viagem de reconhecimento à Guiné-Bissau.
Tirando partido dos atuais quatro voos
diretos por semana que ligam Portugal à Guiné (dois da TAP e dois da
Euroatlantic), a perspetiva da Abreu é lançar a curto prazo programas de
viagens de 5 a 7 dias, "focados no arquipélago de Bijagós mas sem deixar
Bissau de fora, pois os portugueses têm uma ligação grande à cidade",
adianta Leonor Ramos. Na sua perspetiva, o perfil do cliente-alvo para o
destino Guiné é sobretudo o "passageiro que já bateu outros destinos ao
nível de África, como São Tomé". Mas a gestora de programas da Abreu frisa
que neste destino "está tudo ainda muito verde e tem de haver promoção do
país, o que não passa só pelos operadores turísticos, é essencial que o Governo
guineense assuma aqui o seu papel".
NA ROTA DO HIPOPÓTAMO. Os Bijagós têm a
única colónia de hipopótamos marinhos no mundo, havendo programas especiais
para os avistar
O mesmo objetivo é partilhado pela
Solférias. "Faz todo o sentido incluir a Guiné-Bissau na nossa programação
pois África é uma das principais apostas da Solférias", salienta Cláudia
Martins, gestora de produto deste operador turístico. "Estamos a trabalhar
já na programação de verão, válida de maio a final de outubro, e nesta altura
do campeonato o que vamos fazer é lançar de imediato uma brochura com um
combinado entre Bissau e Bijagós para pôr à venda já em fevereiro, e
seguramente antes da BTL."
Do que viu na viagem de reconhecimento à
Guiné-Bissau, a operadora da Solférias adianta que o objetivo é "lançar
programas de uma semana, incluindo cinco noites em Bijagós e uma em
Bissau" e também "conseguir pacotes a preços abaixo dos 2 mil
euros", dependendo das tarifas a negociar com as companhias
aéreas."Vai ser um complemento muito interessante para a nossa
programação", prevê Cláudia Martins, sustentando que a Guiné pode
funcionar como destino "que complementa a nossa oferta 'charter' para Cabo
Verde, embora dirigindo-se a um mercado diferente, que não é do 'tudo
incluído', mas sobretudo clientes que procuram outro tipo de experiências. Cada
vez há mais pessoas a necessitar do contacto com a natureza, do desligar dos
telemóveis, e destinos como este são cada vez mais procurados".
ECOSSISTEMA. O Turismo da Guiné-Bissau
diz-se empenhado em "desenvolver um destino controlado e não massificado
nos Bijagós"
Segundo a gestora da Solférias,
"acreditamos que não será um destino de grande volume, mas nesta fase não
queremos deixar de ajudar a Guiné-Bissau com tudo o que estiver ao nosso
alcance". Salienta que "estão reunidas as condições" para se
lançar este destino novo em Portugal, mas sublinha que há ainda "um longo
caminho para a Guiné fazer, com todas as notícias negativas que têm saído sobre
o país".
"UM PARAÍSO DESCONHECIDO PARA A
MAIORIA DOS PORTUGUESES"
Lara Reis, gestora de produto da
Soltrópico, também considera que o destino "tem muito potencial e o
produto pode ter muita saída em Portugal, mas é preciso mudar a visão que os
portugueses têm da Guiné-Bissau". Sustenta que este "pode vir a ser
um produto Soltrópico", mas ressalva que terá de ser ainda sujeito à
análise do operador turístico relativamente à programação para 2017. Na sua
opinião, "de início, e para não correr muito risco, podíamos começar com
um pacote mais pequeno, de cinco noites, com Bissau e Bijagós, um paraíso ainda
desconhecido para a maioria dos portugueses e que poderá ser um próximo destino
a estar em voga".
Segundo a criadora de pacotes de férias
da Soltrópico, "mais tarde poderíamos fazer uma identificação de pontos
interessantes no país com vista a programas associados a turismo de saudade e
às memórias coloniais, pois há uma grande comunidade de portugueses que
estiveram na Guiné-Bissau e podem ter interesse em voltar ao país e matar
saudades". Frisando que "o que procuramos na Guiné não é um turismo
de massas", Lara Reis refere que no início desta operação "os preços
terão de ser bastante interessantes, em comparação com outros destinos como São
Tomé ou Senegal".
No caso do operador turístico You, a
previsão também passa por lançar programas a curto prazo. "Nós já tínhamos
pensado fazer alguma coisa na Guiné-Bissau", salienta Elisabete Augusto,
diretora de operações da You, para quem a recente visita de reconhecimento ao
destino tornou "o produto mais fácil de trabalhar".
TURISMO DE SAUDADE As memórias coloniais
são visíveis na antiga messe dos oficiais em Bissau, que deu lugar ao Hotel
Azalai
Para lançar o destino Guiné, o objetivo
da You passa por "publicar circuitos de uma semana a 10 dias, com quatro a
cinco noites para ir à praia, e vamos de certeza incluir Bijagós", refere
Elisabete Augusto, adiantando que os programas terão um alcance mais vasto.
"A nossa ideia é também montar um 'tour' pelo interior da Guiné, passando
por cidades como Bafatá ou Gabu, além de Bissau, a pensar nos antigos militares
que querem visitar os lugares onde estiveram durante a guerra colonial".
Como frisa a diretora de operações da You, "vamos trabalhar para que as
pessoas em Portugal possam vir conhecer a Guiné".
Tendo já algum tráfego para a Guiné,
organizando viagens associadas a ações humanitárias, também o Clube Viajar,
cujo operador é o Viajar Tours, tem a perspetiva de começar a lançar pacotes
com Bissau e Bijagós. “O arquipélago dos Bijagós é um paraíso natural e apenas
a quatro horas de distância de Portugal”, faz notar Manuela Varanda, agente de
viagens do Clube Viajar, frisando que, face ao potencial da Guiné ao nível de
programas de lazer, o destino merece começar a ser explorado. “E esta viagem de
reconhecimento demonstrou tratar-se de um destino tranquilo, genuíno e com um
povo muito gentil, além de ter boa comida.”
LANÇAR UM MANUAL DE VENDA PARA OS
AGENTES DE VIAGENS
Para o operador Sonhando, a 'fam trip' à
Guiné-Bissau foi “um sucesso”, e também "um verdadeiro derrubar de
preconceitos, pois apesar da instabilidade política do país encontrámos um
ambiente pacífico e seguro", salienta Mariana Correia, gestora de reservas
da Sonhando.
Destaca ainda as "paisagens
deslumbrantes como o arquipélago dos Bijagós, hotelaria diversificada e de
qualidade, receptivos locais com produtos bem trabalhados e prontos a receber o
turista português".
ENERGIA AFRICANA. Os operadores também
querem destacar a vertente cultural nos programas de viagens à Guiné
Segundo Mariana Correia, "a
Sonhando tudo fará para divulgar e colocar a Guiné-Bissau como um dos destinos
de eleição dos portugueses", através da criação de pacotes de 5 a 7
noites, que serão lançados ainda antes da BTL. "Vamos apostar em programas
de lazer, e também de turismo de saudade associados ao regresso de
ex-combatentes, além caça/pesca ou negócios", adianta.
A operadora da Sonhando adianta que
"a nossa intenção é fazer um manual de vendas para os agentes de viagens
em Portugal, pois sabemos que apesar de uma língua que nos une, existe um
profundo desconhecimento da Guiné Bissau enquanto destino turístico com enorme
potencial".
Apesar de ser mais especializada em
safaris, e tendo o foco em África, também a Across prevê começar a incluir a
Guiné na sua programação já em 2017.
"Esta viagem deu-nos a mostrar a
verdadeira imagem da Guiné", sustenta Reno Maurício, diretor-geral da
Across, frisando que o seu interesse está em "destinos com uma relação
forte com Portugal, locais que não tenham só animais mas também história, algo
com que o cliente português se possa relacionar".
Segundo o diretor-geral da Across,
"vamos já lançar três programas para a Guiné-Bissau, com vertente
cultural, de vida selvagem e de praias", e a curto prazo sairão as respetivas
brochuras para venda nas agências de viagens. "Vamos aproveitar os voos da
Euroatlantic para vender uma série de experiências", que irão resultar em
combinados de Bissau com Bijagós e com locais para safaris, além de
"programas à medida na área de turismo de saudade, em que queremos levar
pequenos grupos de umas 18 pessoas, pois este é um mercado forte na
Guiné".
A nível de preços, Reno Maurício avisa
que "não vamos ser os mais baratos do mercado, pois a nossa guerra não é a
dos preços". Na Across o preço dos programas para este destino vai
depender de uma série de opções disponíveis. "Na Guiné estamos a falar de
um produto que pode ir de pouco mais de mil euros até três mil euros",
avança.
VIDA SELVAGEM. Assistir à desova das
tartarugas na ilha de Poilão é uma das experiências que os turistas podem ter
nos Bijagós
"Eu acho que vai haver uma grande
dose de boa vontade dos operadores que aqui vieram no sentido de promover a
Guiné-Bissau", sustenta o diretor-geral da Across.
A "NECESSIDADE DE RESPIRAR
NATUREZA"
Para alojar os turistas nos Bijagós, a
mira dos operadores está sobretudo no Ponta Anchaca, hotel da francesa Solange
Morin na ilha de Rubane onde os quartos são 'tabankas' de madeira à beira do
mar e entre palmeiras, exalando um ambiente de luxo natural.
"Quando aqui cheguei isto era selva
virgem, não havia nada, nada, tive de fazer tudo do zero", diz Solange
Morin, assumindo o seu "grão de loucura" ao ter vendido os seus
hotéis no Senegal para criar uma unidade nos Bijagós. "Tinha necessidade
de respirar natureza, não há outra sensação de paz e liberdade como há
aqui", confessa.
É a mesma sensação que Solange Morin
quer transmitir aos clientes do hotel. "Quando as pessoas querem ver as
tartarugas ou os hipopótamos, nós podemos fazer isso", garante. O Ponta
Anchaca conta com várias lanchas para passeios e também um avião privado em
permanência para assegurar o transporte dos hóspedes de Bissau. "É um
destino que ainda não é conhecido. As pessoas perguntam: onde ficam os
Bijagós?", refere Solange Morin, que tem recebido sobretudo hóspedes
franceses, belgas, ingleses ou italianos, "e espero que cada vez mais
portugueses".
Além do Ponta Anchaca, são sobretudo os
hotéis virados para a pesca, e também de proprietários franceses, que
predominam nos Bijagós.
ACAMPAR NA PRAIA O Dakosta Island Beach Camp do guineense Adelino da Costa põe a tónica na cultura bijagó
O destaque também vai para o Dakosta
Island Beach Camp, do guineense Adelino da Costa, junto à praia de Bruce em
Bubaque, onde parece que o tempo parou.
Além dos quartos em vivendas, o Dakosta
Island tem também um espaço de tendas marcado por instalações artísticas
associadas à cultura bijagó.
"Estamos num espaço protegido pela
UNESCO, isto é um museu ao ar livre, é a pura natureza que está a faltar no
mundo", faz notar Adelino da Costa, que trocou a vida nos Estados Unidos
(onde é um lutador medalhado e tem uma rede de ginásios em Nova Iorque, com a
marca 'Pump') para estar mais próximo do investimento turístico que quer
reforçar na sua terra.
"A língua portuguesa está-se a
perder aqui", considera Adelino da Costa, lembrando que o investimento
turístico nos Bijagós está a ser feito sobretudo por franceses, e "há zero
de portugueses". Como guineense, propõe-se aqui diferenciar pelo toque da
cultura. "O atraso da Guiné pode tornar-se na sua principal vantagem, pois
os Bijagós ainda estão em estado natural, nada foi estragado", salienta.
"É um local para desligar o telemóvel e desligar de tudo. E isto para os
turistas é o mesmo que lhes dar ouro."
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