domingo, 3 de março de 2019

Voo 3503 AINDA HOJE CARREGO NA ALMA A TRISTEZA DAS FERIDAS DOS MEUS AMIGOS!






Jaime Marinho de Moura
Ten.Pil.
Nova Iorque







Ainda hoje carrego na alma a tristeza das feridas dos meus amigos! Anos de juventude, em brincadeira, trabalho duro, com frieza, tempos idos de amores perdidos que nem sempre terminaram da melhor maneira! Amizades cimentadas pela refrega, calor imenso que encharcava, importante era “sacar” os feridos, camaradagem que tudo entrega, nem saudade, nem lembrança, disfarçado tremer quando no copo pega! Os Mig’s pegaram comigo por acaso, três ou quatro minutos de diversão, bailados de diferentes velocidades, bruma espessa de areia fina feita, que me pareceram Fiat’s nas suas habilidades! Nas matas de Gandembel e Cantanhês o meu encontro do primeiro grau!
Porque não escrevi? A memória fui aliviando, por desgosto e desilusão, o peso descarregando para não contar muito do que vi! Alguns, idos, merecem-me compaixão, outros, vaidosos que nem pavão, fazem-me sorrir, por respeito á sua idade deixo-os acabar absolutamente convencidos que a todos conseguiram enganar! Vi antiaéreas a vomitar, suores frios no abrasador cokpit, subida rápida a 2.500 terminar, sol de costas para apontador encandear, picada louca para a 2.000 as bombas largar, saída á esquerda para rapar, uff, não foi desta e, com fé, assim me hei-de safar! Bombas e foguetes, não, não é, da minha terra o Carnaval, á entrada ouço nos auscultadores do capacete a voz preocupada do Tubarão, tigre abatido nas antiaéreas de Gandembel, velocidade aproveitada e ainda vi o paraquedas a entrar pelo matagal; Melro dois, não faz fogo, siga-me; O paraquedas era do, na altura, Ten. Cor. Costa Gomes, comandante do grupo operacional, o seu asa era o, também na altura, Capitão Vasquez, hoje, os dois, Generais. Vislumbrei-o no meio do arvoredo e, para o galvanizar, pus, á sua frente, as minhas metralhadoras a vomitar! O seu asa, com quem, ainda ontem, estive a falar, em mínimos de combustível regressou a Bissalanca, dizendo-se confortado por eu ali estar! O Gomes da Silva chegou de Dornier, pois andava na missão de distribuir o correio, ficou, aos círculos, em cima do “quartel”, enquanto eu, em passagens baixas, indicava a direcção do aquartelamento, fazendo, de seguida, mais umas rajadinhas, boa maneira de festejar o momento! O nosso comandante de grupo entrou, triunfalmente, pela “porta de armas” da força no terreno, com o espanto do plantão de serviço! História séria contada a sorrir, sem qualquer glória, há outras versões, poetas da minha terra, que bom ficar na memória quando se passou o tempo a dormir! O helicóptero transportou o comandante, á tardinha sou chamado ao seu gabinete e, com dois copos na mão, ele quis oferecer-me um beberete! – Diga-me cá uma coisa, para onde foi quando me deixou? - Bom, fui largar os bombons que o senhor não largou.
Lx, 02/03/2019


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