Victor Barata
Esp.Melec/Inst./Av.
Vouzela
Um testemunho muito importante, para
conhecimento, neste período difícil das nossas vidas.
Maria Salazar, a coronel médica que leva
sabedoria aos lares de idosos
Desde há um mês, as Forças Armadas já
fizeram ações de formação aos funcionários de 631 lares de todo o país. Todo o
plano de ação foi arquitetado por uma mulher que nunca sonhou ser militar e que
agora faz a diferença.
Avatares, drones, carros e motos
telecomandados. Forças Armadas preparam batalhas do futuro
FORÇAS ARMADAS
Avatares, drones, carros e motos
telecomandados. Forças Armadas preparam batalhas do futuro
Almirante Silva Ribeiro, chefe do
Estado-Maior-General das Forças Armadas.
FORÇAS ARMADAS
Silva Ribeiro: "Conseguimos
estancar a saída de militares das Forças Armadas"
A médica e coronel da Força Aérea
integra a Direção de Saúde Militar.
A médica e coronel da Força Aérea
integra a Direção de Saúde Militar.© Reinaldo Rodrigues/Global Imagens
É quase impossível Maria Salazar passar
despercebida quando anda, quase sempre em velocidade e com passadas longas, nos
corredores do quartel-general da Direção de Saúde Militar (DIRSAM) do
Estado-Maior-General das Forças Armadas (EMGFA).
Se o sonante apelido, instintivamente,
já provoca reações, o seu elegante 1,87 metros, dentro de um uniforme
camuflado, e os olhos vivos que espreitam debaixo da máscara não deixam mesmo
ninguém indiferente.
A médica e coronel da Força Aérea
coordena 139 equipas de militares no terreno.
A médica e coronel da Força Aérea
coordena 139 equipas de militares no terreno.© Reinaldo Rodrigues/Global
Imagens
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Mas, mais do que isso, o seu trabalho
tornou-se uma peça fundamental em centenas de lares de idosos por todo o país,
com um plano pioneiro que está a levar conhecimento e ensinamentos aos
funcionários destas instituições sobre como prevenir o contágio pelo novo
coronavírus.
Comando Conjunto para as Operações
Militares: as Forças Armadas acompanham em permanência a evolução
COVID-19
Saúde reforçada com planeamento militar
no combate à pandemia
Maria Salazar, 49 anos, coronel da Força
Aérea, médica formada na Faculdade de Medicina de Lisboa, com a especialidade
de Gastroenterologia, é quem está à frente do programa das Forças Armadas para
as ações de sensibilização em lares, em apoio ao Ministério do Trabalho,
Solidariedade e Segurança Social (MTSSS).
Até 5 de novembro, cerca de um mês
depois do arranque desta gigantesca operação, foram já visitados pelos
militares 631 lares.
Até 5 de novembro, cerca de um mês
depois do arranque desta gigantesca operação, foram já visitados pelos
militares 631 lares, do total de 2770 que o MTSSS atribuiu às Forças Armadas, a
cujas ações de formação assistiram 7748 funcionários.
Escapa com ligeireza às perguntas mais
pessoais e devolve quase sempre respostas que envolvem o trabalho. Ainda
conseguimos a confidência de que nunca sonhou ser militar. "Foi por mero
acaso", admite a oficial. "Por curiosidade e insistência de uma
grande amiga fui assistir a uma sessão de esclarecimento na Força Aérea, no
âmbito de um concurso que se destinava a recrutar médicos para o quadro
permanente do Hospital Militar. Foi muito importante e apelativo saber que
havia ali uma alternativa para a minha carreira. Como estava a pouco menos de
dois meses de ter de escolher a especialidade, entrando na carreira militar
teria acesso imediato ao que queria, gastroenterologia, ainda com a mais-valia
de ficar colocada em Lisboa, quando naquela altura, na minha geração, não só
era difícil ter acesso logo a vagas para esta especialidade no Serviço Nacional
de Saúde como também nos primeiros anos seria sempre colocada noutras zonas do
país", conta, de um fôlego.
"O facto de ter estudado na Escola
Alemã e estar habituada a ambientes disciplinados e a hierarquias era uma
vantagem, que depois se comprovou como uma ótima base para me adaptar à vida
militar."
Depois veio a dúvida de quem nunca tinha
pensado numa carreira militar. "Será que vou conseguir habituar-me?
Acreditei que sim. Por um lado, o facto de ter estudado na Escola Alemã e estar
habituada a ambientes disciplinados e a hierarquias era uma vantagem, que
depois se comprovou como uma ótima base para me adaptar à vida militar. Mas
também cresci com o meu pai, que cumpriu o serviço militar na Marinha e era
oficial da Reserva Naval, sempre com muita estima pelas Forças Armadas. A única
coisa que ele me disse quando o informei de que tinha concorrido à Força Aérea
foi 'ao menos podia ter sido a Marinha!'", assinala com um sorriso nos
olhos.
Pensar fora da caixa
Maria Salazar é filha do economista
Ernâni Lopes, falecido em 2010, que foi ministro das Finanças de Mário Soares,
governador do Banco de Portugal e também fundador da Associação dos Oficiais de
Reserva Naval.
"Focada, inteligente e dinâmica.
Pensa fora da caixa", diz-nos um oficial que trabalha com a coronel.
"A grande mais-valia de ser médica militar é fazer muitas coisas em áreas
completamente diferentes. Sou gastrenterologista, tenho competências em
medicina aeronáutica e assumi diferentes chefias", reconhece a médica.
Antes desta nova missão, ainda quando a
pandemia era observada ao longe, Maria Salazar estava envolvida numa nova
estrutura do EMGFA, a Unidade de Ensino, Formação e Investigação da Saúde
Militar.
Maria Salazar, médica e coronel da Força
Aérea responsável por todas as ações da Direcção de Saúde Militar
Maria Salazar, médica e coronel da Força
Aérea responsável por todas as ações da Direcção de Saúde Militar do
Estado-Maior-General das Forças Armadas (EMGFA) nos lares, militares e civis,
no âmbito da covid-19.© Reinaldo Rodrigues/Global Imagens
"Há anos que se fala nesta nova
unidade, que faz parte da grande reforma da saúde militar. Serve de elemento
diferenciador na criação de novas aptidões na saúde militar para os três
Ramos", explica a médica. Mas "quando caiu a bomba em março, pouco
antes da declaração do estado de emergência, no dia 18", passou "a
fazer parte da task force Covid-19".
Nos cenários e no planeamento que tinham
começado a ser traçados pelos analistas militares, desde fevereiro, antes de a
pandemia se instalar no nosso país, os lares de idosos surgiam já à cabeça das
preocupações, a começar pelos três do Instituto de Ação Social das Forças
Armadas (IASFA).
O Centro de Comando para as Operações
Militares - CCOM.
CORONAVÍRUS
Os planos, a tensão e o bunker "secreto"
da guerra biológica nas Forças Armadas
"Víamos o que estava a acontecer em
Espanha, e a apreensão era enorme. Decidimos logo trabalhar com um dos nossos
lares, em projeto-piloto. Partir do zero, ver tudo o que estava feito, planos,
organização. Ficámos satisfeitos com o que vimos. Testámos toda a gente:
residentes, funcionários, todos os que ali entregavam mercadorias. Para nossa
surpresa, naquela estrutura tão bem organizada, havia três idosos positivos.
Foi um momento muito difícil, com funcionários e familiares com muito medo.
Decidimos que a única forma de os ajudar era estar lá com eles o tempo todo.
Foram revistos todos os procedimentos, recordados todos os passos, coisas que
não podem ser esquecidas, como lavar as mãos. O truque está mesmo nas coisas
simples. Nada pode falhar. O segredo é mesmo a formação. Foi uma equipa do
Hospital das Forças Armadas fazer essa formação e esteve lado a lado com eles o
tempo todo, até a desenhar os circuitos no chão. Depois disto, instalou-se a
serenidade", recorda.
Mais de 300 militares no terreno
Com a segunda vaga a aproximar-se, o
Governo pediu ajuda ao EMGFA. Era preciso voltar ao terreno e levar
conhecimento, insistir nas tais "coisas simples". Com os
procedimentos já testados nos lares do IASFA, o diretor da Saúde Militar,
major-general Jacome de Castro, entregou a Maria Salazar esta missão.
"Entre a decisão do MTSSS e mandarmos as equipas para o terreno foi uma
semana, um recorde", frisa a coronel.
Almirante António Silva Ribeiro, Chefe
de Estado-Maior-General das Forças Armadas
PODER
Forças Armadas preparam sensibilização e
desinfeção em 800 escolas secundárias
As equipas que na primeira vaga tinham
feito as ações de sensibilização nas escolas, nas prisões e noutros organismos
foram de novo ativadas e alvo de formação específica atendendo às necessidades
destas estruturas residenciais.
Com uma lista de 2770 lares no mapa,
atribuídos pelo MTSSS, prepararam 139 equipas (130 do Exército, cinco da
Marinha e quatro da Força Aérea), com mais de 300 militares dos três ramos, e
em apenas um mês já foram a 631 lares.
"A presença dos militares é um
fator muito importante para transmitir confiança e credibilidade às
pessoas."
"A presença dos militares é um
fator muito importante para transmitir confiança e credibilidade às
pessoas", salienta a coronel médica. Estas equipas tiveram formação nos
conteúdos específicos para os lares e também foram treinadas em comunicação.
O primeiro passo, quando chegam, é
verificar, através de uma check list, o que está a ser feito e reforçar, na
formação, os conteúdos que sejam necessários.
O plano gizado por Maria Salazar
consiste em duas fases: uma é constituída pelas ações de sensibilização,
"numa abordagem prática, adequada ao dia-a-dia da instituição"; a
segunda, uma estreia absoluta, são sessões de esclarecimento online, em tempo
real.
Coordenados pelo capitão-tenente Luís
Farinha, médico anestesista da Marinha, médicos, enfermeiros e farmacêuticos
militares estão diariamente junto aos computadores na Dirsam e, através, da
plataforma Teams, vão esclarecendo as dúvidas dos funcionários dos lares.
Maria Salazar, médica e coronel da Força
Aérea responsável por todas as ações da Direcção de Saúde Militar
Maria Salazar, médica e coronel da Força
Aérea responsável por todas as ações da Direcção de Saúde Militar do
Estado-Maior-General das Forças Armadas (EMGFA) nos lares, militares e civis,
no âmbito da covid-19. Na imagem com José Pereira, primeiro-tenente da Marinha,
durante uma ação de formação online para os lares.© Reinaldo Rodrigues/Global
Imagens
"Percebem que não estão sozinhos,
há sempre alguém deste lado para ajudar", afirma a coronel médica,
mostrando a sala onde estão os operacionais no Teams desse dia, com
auscultadores e microfone, a falar para o computador, em cujo ecrã se veem as
imagens de técnicos e funcionários de lares.
A previsão de Maria Salazar é que todas
as ações de sensibilização terminem até ao fim do ano e que as sessões no Teams
se prolonguem durante mais cerca de um mês depois disso. "As maiores
preocupações que temos sentido da parte dos lares prendem-se com a
reorganização dos recursos humanos, caso alguém fique infetado. Muitas
instituições não têm possibilidade de ter equipas em espelho. A manta é muito
curta", assinala esta responsável.
"É preciso contrariar o medo para
se conseguir trabalhar. O medo bloqueia o encontrar soluções."
Em jeito de balanço, de "lições
aprendidas", que começaram nos lares do IASFA, esta oficial da Saúde
Militar destaca uma: "É preciso contrariar o medo para se conseguir
trabalhar. O medo bloqueia o encontrar soluções."
Forças Armadas no combate à covid-19
Além das ações nos lares, as Forças
Armadas estão noutras frentes da guerra contra a pandemia:
- disponibilização de sete centros de
acolhimento com um total de 504 camas;
- ações de descontaminação, pelo
Exército;
- núcleo de Apoio à Decisão, com quatro
oficiais do EMGFA, para assessorar a ARSLVT na gestão de camas hospitalares;
- acolhimento de 49 doentes de covid-19
nos hospitais das Forças Armadas, transferidos de vários hospitais da zona
norte, de Loures e Setúbal;
- identificação e gestão de 7890
voluntários da "Família Militar", que se disponibilizaram para apoiar
nos centros de acolhimento de doentes, em caso de necessidade.
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