Miguel Pessoa
Cor.Pil.Av.
Lisboa
É UMA INJUSTIÇA!...
Talvez se recordem de haver, há muitos anos atrás, uma série de desenhos animados com o Calimero, um patinho preto que usava uma casca de ovo à laia de chapéu, e que passava o tempo a lastimar-se de tudo o que lhe acontecia: “É uma injustiça! É uma injustiça!”.
Foi um pouco assim com uma decisão das chefias que me fez sentir que não
tinha sido tratado em plano de igualdade com outros meus camaradas.
Mas vamos começar pelo princípio: Iniciei a minha comissão na Guiné em
Novembro de 1972 e, apenas quatro meses depois de lá ter chegado, fui
recambiado para Lisboa para recuperar das mazelas sofridas na ejecção de um
avião Fiat G-91 atingido por um míssil.
Naquele tempo a medicina aeronáutica ainda estava um pouco incipiente e o
Hospital da Força Aérea ainda não existia. Assim, a minha recuperação passou
pelo Serviço de Ortopedia do Hospital Militar (do Exército), que tratou
razoavelmente da recuperação da minha perna partida. O mesmo não posso dizer de
outros dois aspectos importantes que foram descurados: A recuperação da minha
coluna, que tinha sofrido uma compressão de vértebras de 2 centímetros (perdi 2
cms de altura, que não recuperei…) e o apoio psicológico para ultrapassar o
stress da situação vivida, agravado pela necessidade de me adaptar à ideia de
voltar a operar no mesmo teatro de operações.
O "corpo do delito" - O Fiat G-91 5413 abatido em 25 de Março
de 1973 na zona do Guileje |
O facto é que esses dois aspectos acabaram por ficar à minha conta no meu
regresso á Guiné quatro meses depois – e se no primeiro caso pouco pude fazer
para além de ver a coluna a piorar com o tempo, já a readaptação à actividade
aérea foi ultrapassada com grande esforço da minha parte, sem nenhum
acompanhamento profissional e dependendo unicamente de mim e da possível
solidariedade dos outros camaradas.
No ano de 1973 acabei por não gozar férias, para compensar o tempo perdido
na minha recuperação; e em 1974 as únicas férias que gozei na comissão acabaram
por coincidir com o período revolucionário pós-25 de Abril… Tinha chegado a
Lisboa em 22 de Abril de 1974…
Calculam o meu espanto quando, no regresso à Guiné, fui informado de que os
meus três camaradas que se tinham igualmente ejectado, tinham “passado” pela
Guiné para fazerem o desquite e encerrarem a sua comissão de serviço. Parece
que a argumentação terá sido a dificuldade de adaptação dos pilotos à
actividade aérea depois dos traumas psicológicos sofridos…
Naturalmente perguntei: “Então e eu?!...”. - “Ah, pois. Parece que
consideraram que tu podias continuar, que já tinhas passado a parte difícil…”
(Na altura eu já tinha feito cerca de mais 9 meses de comissão, fazendo das
tripas coração e readaptando-me como possível às rotinas do dia-a-dia).
A irritação acabou por me passar. A actividade aérea passou a ser mais
reduzida na fase final da minha comissão (depois do 25 de Abril), não passei
por situações de grande risco e, chegado o termo da minha comissão, em meados
de Agosto de 1974, pude regressar à metrópole com a satisfação do dever
cumprido… e sem dever nada a ninguém…
Mas ainda hoje penso quais foram os critérios para um tratamento diferente
entre pessoas que tinham passado pelo mesmo, e sem me ter sido transmitida uma
palavra sequer sobre o assunto…
Miguel Pessoa
Caro Coronel Pessoa, fico feliz por saber que ainda está ativo e isso é bom para ver se os Zés especiais acordam.
ResponderEliminarNo meu caso, não cheguei a Tenente Coronel por culpa minha, tive cunhas e nunca as utilizei e sinto-me feliz por isso, respeitosos cumprimentos para a família.